A oxigenação adequada dos tecidos é essencial para a sobrevivência celular. Quando o oxigênio disponível no sangue arterial é insuficiente para garantir essa entrega, ocorre a hipoxemia, uma condição frequente em diversos cenários clínicos, especialmente nas doenças pulmonares e estados críticos.
Neste artigo, você vai entender o que é a hipoxemia, como ela se diferencia da hipóxia, os mecanismos fisiopatológicos envolvidos, formas de diagnóstico e tratamento, além de comparações importantes com a insuficiência respiratória hipercápnica — um tema que, aliás, costuma aparecer com frequência nas provas de residência médica.
A hipoxemia é definida como a redução anormal da pressão parcial de oxigênio no sangue arterial (PaO₂) ou da saturação periférica de oxigênio (SpO₂). Em adultos, considera-se hipoxemia quando:
É importante lembrar: a hipoxemia não é uma doença em si, mas um achado laboratorial, que sinaliza um problema na oxigenação do sangue.
Apesar de frequentemente usadas como sinônimos, hipoxemia e hipóxia não são a mesma coisa.
Toda hipoxemia pode levar à hipóxia, mas nem toda hipóxia decorre de hipoxemia. Por exemplo, em casos de choque circulatório, intoxicação por cianeto ou anemia severa, os tecidos podem não receber ou não conseguir utilizar adequadamente o oxigênio mesmo com níveis normais de PaO₂.
Existem alguns mecanismos principais que levam à hipoxemia:
ETIOLOGIAS DA INSUFICIÊNCIA RESPIRATÓRIAAGUDA TIPO I OU HIPOXÊMICA |
Infecções (bactéria, vírus e fungos) |
Edema agudo de pulmão cardiogênico |
Lesão pulmonar/SDRA |
Embolia pulmonar |
Atelectasia |
Fibrose pulmonar/intersticiopatias |
Hemoptise |
Neoplasias |
Traumáticas: contusão pulmonar |
A principal ferramenta de rastreio é a oximetria de pulso (SpO₂) — método não invasivo, de fácil acesso e amplamente utilizado tanto em adultos quanto em crianças.
Contudo, em situações de dúvida diagnóstica ou em pacientes com risco de dis-hemoglobinemias (como intoxicação por monóxido de carbono), é necessária a gasometria arterial, que fornece uma avaliação direta da PaO₂.
Em contextos de hipoxemia crônica ou noturna, como na apneia obstrutiva do sono ou na DPOC avançada, o monitoramento contínuo pode revelar quedas intermitentes de saturação que não seriam detectadas em avaliações pontuais.
A gravidade da hipoxemia pode ser classificada com base nos níveis de PaO₂:
Além disso, pode ser:
Inicialmente precisamos definir a causa, isso pode ser feito através de exames laboratoriais (incluindo uma gasometria preferencialmente arterial), monitoramento clínico-hemodinâmico, uso de exames de imagem (radiografia simples de tórax, ultrassom à beira-leito e, mais especificamente, tomografia de tórax com ou sem contraste), entre outros exames mais específicos a depender da suspeita clínica.
O tratamento depende da causa subjacente e da gravidade da hipoxemia. O objetivo é restaurar uma oxigenação adequada, prevenir lesão tecidual e tratar a condição de base.
As estratégias incluem:
Durante a pandemia de COVID-19, popularizou-se o termo “hipoxemia feliz” ou “hipoxemia silenciosa”, que descreve pacientes com saturações muito baixas, mas sem sinais clássicos de desconforto respiratório. A explicação ainda não é totalmente clara, mas envolve alterações na percepção de dispneia mediadas pelo sistema nervoso central.
Essa dissociação reforça a importância de monitorização objetiva da oxigenação em cenários de risco.
A hipoxemia pode ocorrer isoladamente ou associada à hipercapnia. Quando o problema envolve também a retenção de CO₂, temos a insuficiência respiratória hipercápnica (PaCO₂ > 45 mmHg).
Tipo de Insuficiência | Característica principal | Exemplos |
Hipoxêmica (Tipo I) | PaO₂ < 60 mmHg | SDRA, pneumonia grave, TEP |
Hipercápnica (Tipo II) | PaCO₂ > 45 mmHg | DPOC grave, intoxicação por opioides, doenças neuromusculares |
Nem toda hipoxemia vem acompanhada de hipercapnia, mas ambas podem coexistir, especialmente em quadros avançados de hipoventilação alveolar como DPOC ou na falência respiratória global (doenças neuromusculares).
Tipo II (Hipercápnica) |
Depressão do SNC (overdose de drogas, lesões estruturais ou isquêmicas no centro respiratório) |
Neuropatia (S. Guillain Barré, ELA, paralisia do n. frênico, poliomielite) |
S. Pickwick (hipoventilação da obesidade) |
Doença muscular (distrofia muscular, miastenia gravis) |
Fadiga muscular |
Hipoventilação ou limitação à expiração (asma e DPOC) |
Redução da expansibilidade torácica (esclerodermia) |
Sim!
O tema cai com frequência nas provas de residência, principalmente em questões relacionadas a distúrbios do equilíbrio ácido-base, insuficiência respiratória, SDRA e condutas em UTI.
O conhecimento sobre os mecanismos fisiopatológicos, interpretação de gasometria arterial, uso racional de oxigenoterapia e classificação da insuficiência respiratória são frequentemente abordados nas bancas mais tradicionais.
A hipoxemia é um achado clínico comum, multifatorial e potencialmente grave. Identificá-la precocemente, compreender seus mecanismos e saber manejá-la de forma adequada são habilidades fundamentais para todo médico, especialmente aqueles que atuam em emergência, clínica médica e terapia intensiva.
Ao dominar esse tema, você não apenas melhora a sua prática clínica, mas também aumenta sua segurança na abordagem de pacientes graves e ganha vantagem competitiva nas provas de residência médica.
Professora da Medway. Formada pela Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC), com Residência em Clínica Médica (2019-2021) e Medicina Intensiva (2022-2025) pela Universidade de São Paulo (USP - SP). Siga no Instagram: @anakabittencourt