Diagnóstico e tratamento da insuficiência adrenal primária: como fazer

Conteúdo / Medicina de Emergência / Diagnóstico e tratamento da insuficiência adrenal primária: como fazer

E ai galera, bom demais? Seguinte, hoje vamos falar sobre um tema que assusta bastante gente, mas que vocês podem ficar tranquilos porque hoje vamos destrinchar e facilitar o diagnostico e tratamento dela: a insuficiência adrenal primária!

Antes de darmos continuidade ao assunto, no e-book Manual da gasometria arterial: distúrbios ácido-básicos, falamos tudo sobre como interpretar uma gasometria arterial com rapidez e segurança, inclusive sobre como raciocinar a partir das principais causas de distúrbios ácido-básicos vistas ao longo dos seus estudos. Faz já o download dele clicando AQUI e comece a se aprimorar.

Agora sim. Bora lá?

Vamos do começo!

Pra começar, vamos relembrar sobre a função e funcionamento das suprarrenais. Cada glândula contém um córtex que produz hormônios esteroides, e uma medula, que produz catecolaminas. No córtex suprarrenal, a produção dessas três classes principais de esteroides ocorre em zonas específicas: 

  • A camada mais externa, a glomerulosa, produz mineralocorticoides, primariamente aldosterona; 
  • A camada intermediária, a fasciculata, produz glicorticoides, primariamente cortisol; 
  • A camada mais interna, a reticular, produz androgênios suprarrenais, primariamente de-hidroepiandrosterona (DHEA) e seu conjugado sulfatado (DHEA-S).

Os mineralocorticoides atuam principalmente na reabsorção de sódio e secreção de potássio.

Já o cortisol e os outros glicocorticoides tem ações mais amplas, incluindo efeitos na manipulação de carboidratos, metabolismo de lipídio e cálcio, e nos sistemas imune e nervoso. 

Os androgênios são os produtos mais abundantes da glândula suprarrenal. São convertidos em estrogênios e testosterona nos tecidos periféricos e ativam os receptores de androgênios e estrogênios.

A insuficiência suprarrenal primária, também conhecida como doença de Addison, tem uma prevalência de 2 em 10.000. Cerca de 50% dos casos são adquiridos, geralmente causados pela destruição autoimune das glândulas suprarrenais; os outros 50% são genéticos, causados mais comumente por bloqueios enzimáticos que afetam a síntese dos glicocorticoides (como na hiperplasia suprarrenal congênita por exemplo). 

Manifestações clínicas

As apresentações da insuficiência suprarrenal primária podem ser agudas ou crônicas. 

  • Insuficiência aguda:

A apresentação clínica característica da insuficiência suprarrenal primária aguda inclui hipotensão ortostática, agitação, confusão, dor abdominal e febre. 

  • Insuficiência cronica: 

Em contraste, a história e os achados clínicos típicos de insuficiência suprarrenal primária crônica incluem uma história longa de mal-estar, fadiga, anorexia, perda de peso, dor nas articulações e nas costas e escurecimento da pele (rugas das mãos, superfícies extensoras, cicatrizes recentes, mucosa bucal ou vaginal e mamilos). 

Tanto nos casos agudos quanto crônicos, os pacientes podem desejar ingerir sal e desenvolver preferências alimentares incomuns, como beber o líquido da conserva de picles. 

Achados clínicos da insuficiência adrenal primária
História clínicaFrequênciaExame físicoFrequência
• Fraqueza, fadiga e cansaço99% a 100%• Hiperpigmentação92% a 97%
• Perda de peso97% a 100%• Hipotensão postural82% a 91%
• Anorexia97% a 100%• Vitiligo10% a 20%
• Náusea e vômitos56% a 87%
• Constipação33%
• Dor abdominal31%
• Diarreia16%
• Avidez por sal16% a 22%
• Síncope12% a 16%
• Mialgia e artralgias6% a 13%

Características bioquímicas associadas para ambas as apresentações (aguda e crônica) incluem hiponatremia, hipoglicemia, hipercalemia, eosinofilia sem explicação e azotemia pré-renal leve.

A hiponatremia constitui um achado bioquímico característico na insuficiência suprarrenal primária e é encontrada em 80% dos pacientes na apresentação. 

Verifica-se a presença de hiperpotassemia em 40% dos pacientes no diagnóstico inicial. A hiponatremia é principalmente causada pela deficiência de mineralocorticoides. A deficiência de glicocorticoides também resulta em ligeiro aumento das concentrações de TSH, que se normalizam dentro de poucos dias a semanas após o início da reposição com glicocorticoides.

Crise suprarrenal 

A insuficiência suprarrenal aguda, também é chamada de crise suprarrenal, acontece geralmente depois de um período prolongado de queixas inespecíficas e é observada, com mais frequência, em pacientes com insuficiência suprarrenal primária, devido à perda da secreção de glicocorticoides e de mineralocorticoides. 

A hipotensão postural pode progredir para choque hipovolêmico. A insuficiência suprarrenal pode simular manifestações do abdome agudo, com hipersensibilidade abdominal, náusea, vômitos e febre. Em alguns casos, a apresentação primária pode lembrar uma doença neurológica, com diminuição da responsividade, evoluindo para estupor e coma. 

Em algumas situações, os sintomas poderão ser agudos e dramáticos. Os principais fatores predisponentes são: trauma, cirurgia, infecções, desidratação (diarreia ou vômitos intensos), interrupção de uso de glicocorticoide, hemorragias, queimaduras. Nessa situação dramática o paciente costuma apresentar:

  • Taquicardia, hipotensão, náuseas e vômitos com rápida evolução para choque hipovolêmico, muitas vezes refratário à reposição de volume.
  • Dor abdominal, algumas vezes mimetizando emergência cirúrgica abdominal.

Diagnóstico

Além dos achados laboratoriais sugestivos, como a hiponatremia e hipercalemia, a dosagem de cortisol também pode ser realizada para confirmar o diagnóstico. 

Sempre que a gente pensar em dosar cortisol, temos que lembrar que essa dosagem deve ser feita no período da manhã, por volta das 8 horas da manhã, já que é quando ele é fisiologicamente liberado. 

Se estiver menor ou igual a 3 microgramas/dL, o diagnóstico de insuficiência adrenal é confirmado. Um valor acima de 19 praticamente exclui o diagnóstico. 

Nas situações onde não conseguimos confirmar o diagnóstico pela dosagem de cortisol, o recomendado é fazer o teste de estimulação adrenal com ACTH semissintético (cortrosina 250 microgramas). 

Após a aplicação da dose, mede-se o cortisol no tempo 0, 30 e 60 minutos após a aplicação. Valores abaixo de 20 microgramas/dL confirmam o diagnóstico de insuficiência adrenal.

Tratamento da insuficiência adrenal primária

  • Insuficiência aguda 

A crise adrenal aguda pode ser potencialmente fatal se não tratada a tempo. O tratamento inicial inclui estabilização do paciente: medidas de controle de PA, glicemia e MOV.

Alem disso, na crise, deve ser prescrito hidrocortisona 100mg IV em bolus imediatamente, seguida de 50 a 100 mg IV 6/6h. Essa dose pode ser diminuída após 48-72 horas, de acordo com a evolução do paciente e se o fator precipitante tiver sido tratado. 

  • Insuficiência crônica

A terapia nos casos de insuficiência cronica tem como objetivo uma reposição o mais fisiológica possível. É feita através da administração de 10 a 12 mg/kg de hidrocortisona diariamente em uma ou três doses orais que tentam mimetizar a variação fisiológica diurna das concentrações de cortisol. A hidrocortisona oferece a vantagem de comprimidos de múltiplas doses, que permitem um ajuste fino e a divisão da dose diária. 

Outros glicocorticoides podem ser utilizados na terapia para reposição diária. A prednisona, 5 a 7,5 mg diários, possui a vantagem de uma meia-vida longa e pode ser particularmente útil em pacientes com fadiga no período da tarde ou da noite. 

Pacientes com insuficiência suprarrenal primária devem ser encorajados a salgar seu alimento e a não limitar a ingestão de sal. Aproximadamente todos os pacientes exigem um mineralocorticoide, como fludrocortisona de 50 a 300 μg/dia. 

No caso dos pacientes crônicos, é sempre bom lembrar dos ensinamentos do nosso mago da preventiva, Djon, e olhar o paciente como um todo. A educação do paciente sobre sua doença é fundamental para boa adesão à medicação, a fim de evitar possíveis crises agudas. 

E aí, tá dominando o assunto?

Se não pegou tudo de uma vez, calma! O tratamento da insuficiência adrenal primária é um assunto mais complicadinho mesmo, mas pode voltar aqui quantas vezes precisar para tirar todas as suas dúvidas. A dica pra insuficiência adrenal é se ligar num paciente com hiponatremia e hipotensão no OS. Fique ligado aqui no blog, a gente ainda tem muita coisa maneira pra discutir juntos!

Bom, agora que você está mais informado, temos uma dica pra você. Confira mais conteúdos de Medicina de Emergência na Academia Medway. Por lá disponibilizamos diversos e-books e minicursos completamente gratuitos! Por exemplo, o nosso e-book ECG Sem Mistérios ou o nosso minicurso Semana da Emergência são ótimas opções pra você estar preparado para qualquer plantão no país.

Caso você queira estar completamente preparado para lidar com a Sala de Emergência, temos uma outra dica que pode te interessar. No nosso curso PSMedway, através de aulas teóricas, interativas e simulações realísticas, ensinamos como conduzir as patologias mais graves dentro do departamento de emergência! É isso, galera.

Pra cima!

*Colaborou Emanuella Esteves Machado, aluna de Medicina da EMESCAM

É médico e quer contribuir para o blog da Medway?

Cadastre-se
AnuarSaleh

Anuar Saleh

Nascido em 1993, em Maringá, se formou em Medicina pela UEM (Universidade Estadual de Maringá). Residência em Medicina de Emergência pelo Hospital Israelita Albert Einstein.