Manejo clínico da miocardite: saiba mais!

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Alô alô, moçada! Hoje vamos falar sobre o manejo clínico da miocardite no departamento de emergência. Mas o manejo depende da forma de apresentação, então, é fundamental que você entenda como uma miocardite pode se apresentar e qual caminho você irá seguir no manejo. 

Manejo clínico da miocardite: saiba mais!
Saiba mais sobre o manejo clínico da miocardite

Para começar a falar sobre o manejo clínico da miocardite…

De longe, a principal causa de miocardite são as infecções virais, que se manifestam de dias a semanas após um quadro de infecção de via aérea superior ou gastroenterite. Mas também temos outras causas, menos comuns: 

  • infecções bacterianas;
  • infecções fúngicas; 
  • alérgenos;
  • drogas; 
  • entre outros. 

Mas eu quero que você grave isto: você vai ver um paciente com história prévia de pródromos de infecção viral (coriza, congestão nasal, rinorreia, diarreia aquosa autolimitada…) e que, dias a semanas após o quadro, apresenta piora ou surgimento de sintomas cardíacos. 

Essa é a visão clássica do seu paciente: a miocardite pós-infecção viral. Outro exemplo é dado quando nosso paciente apresenta sintomas cardíacos associados a rash/eosinofilia e história prévia de contato com alérgenos/drogas. 

E o que seriam estes sintomas cardíacos? Aqui, chegamos a um ponto importante: miocardite pode tudo no coração! Desde um paciente completamente assintomático, que apresenta apenas alterações laboratoriais sugestivas de dano cardíaco (ex: troponina elevada, ECG alterado), até um choque cardiogênico franco de evolução rápida.

Em resumo, teremos as seguintes apresentações: (1) forma assintomática, (2) miocardite aguda – que pode se apresentar como uma insuficiência cardíaca aguda, uma síndrome coronariana aguda ou uma miopericardite aguda. 

Na forma assintomática, o que irá nos sugerir o diagnóstico são alterações em exames, como a troponina, ECG e/ou função cardíaca (ECO ou RNM). 

Manejo clínico da miocardite 

Entramos, de fato, no manejo clínico. E entenda que, quando não está estampado em nossas faces, o diagnóstico de miocardite acaba ficando em segundo plano. Lembre-se mais uma vez: miocardite pode tudo no coração! 

Para começar te assustando: uma forma de apresentação da miocardite é a morte súbita. A condição é responsável por cerca de 20% das mortes súbitas com doença cardíaca não conhecida em pacientes com menos de 40 anos.

Dor torácica

Por que eu falo isso? A forma assintomática pode se apresentar com elevação de troponina e ECG com supra/infra de ST, bem como a miocardite aguda pode se apresentar de forma indistinta a uma síndrome coronariana aguda, inclusive, com dor e alterações laboratoriais típicas.

Você vai apostar em uma miocardite ou seu cérebro vai direto para o fluxo de síndromes coronarianas agudas (SCA)? Com certeza, o manejo do paciente começará com medicamentos para SCA, bem como com o ato de enviar o paciente para a estratificação invasiva. 

E sua grande surpresa será um CATE branco, sem obstrução de coronárias. Por isso, a miocardite é uma das causas de Troponin-positive with non-obstructive coronary arteries (TpNOCA).

Distúrbios Elétricos

O que mais a miocardite pode causat? A agressão ao músculo cardíaco pode se dar em qualquer local onde há miocárdio, gerando disfunção não só mecânica como elétrica do músculo. 

No caso de disfunções elétricas, podemos ter tanto bradiarritmias quanto taquiarritmias, desde atriais até ventriculares. Como manejamos isso?

  • extrassístoles atriais ou ventriculares assintomáticas: conduta expectante;
  • taquicardias supraventriculares: reversão imediata, seja com adenosina ou cardioversão elétrica, dependendo da estabilidade e/ou refratariedade do quadro;
  • taquicardias ventriculares: SEMPRE manejar! Se for não sustentada (< 30 segundos e estabilidade hemodinâmica), o manejo é com antiarrítmicos. Se for sustentada, a cardioversão elétrica imediata se faz necessária;
  • bloqueio atrioventricular total (BAVT) ou bradiarritmias sintomáticas devem ser manejadas com marcapasso provisório;
  • Obviamente, em caso de parada cardiorrespiratória, o manejo será conforme o protocolo do ACLS.

A anticoagulação está indicada a todos os pacientes que apresentem fibrilação atrial (FA) paroxística, ou permanente, trombos intracavitários ou fenômenos tromboembólicos prévios.

Insuficiência Cardíaca Aguda

Conforme mencionado, a disfunção do miocárdio também pode-se dar de forma mecânica, levando o paciente aos mais diversos graus de insuficiência cardíaca. E, aqui, um outro insight: a apresentação clássica da miocardite é a insuficiência cardíaca de início recente após um “quadro viral”. Grave isso! 

Se temos insuficiência cardíaca leve, com paciente estável, está indicado iniciarmos o tratamento “padrão” para IC: inibidores da enzima conversora de angiotensina (IECA) + betabloqueador (lembrem-se dos betabloqueadores que, de fato, alteram sobrevida na IC – carvedilol, bisoprolol e succinato de metoprolol). 

É indicado, também, a restrição hídrica de 1.000 a 1.500mL por dia, associada à restrição de sal na dieta de 2-3g diários. Anti-inflamatórios são contraindicados nos pacientes com insuficiência cardíaca, bem como tabagismo e etilismo.

No caso de pacientes com insuficiência cardíaca instáveis, não é momento de iniciarmos o IECA e nem o betabloqueador. Lembre-se disto para sua vida: NUNCA iniciamos o betabloqueador em pacientes instáveis

Neste momento, é hora de dar suporte ao ventrículo: seja com inotrópicos (ex: dobutamina), dispositivos de assistência ventricular (ex: balão intra aórtico) e até mesmo com apoio da oxigenação por membrana extracorpórea (ECMO). 

A expectativa é que, após o suporte inicial que dermos ao nosso paciente (elétrico, mecânico), haja uma melhora da função cardíaca, por isso, na fase aguda da miocardite, não está indicado o transplante cardíaco. 

Quando realizar a biópsia endomiocárdica (BEM)

Lembre-se: quando o paciente não vai bem e encontra-se refratário às medidas, a biópsia, normalmente, está indicada. Qual é o grande objetivo da biópsia? Não é para dar o diagnóstico.

O diagnóstico, inclusive, pode ser dado de forma não invasiva, através de ressonância magnética cardíaca (com os critérios de Lake-louise) associado à clínica. O grande objetivo da biópsia é determinar a causa da miocardite, pois, sabendo a causa, podemos instituir terapias específicas! 

Então, por que então não fazemos de cara a BEM para todos os pacientes? Primeiro, te darei a resposta mais óbvia, que é: estaremos fazendo uma biópsia do coração, um tecido nobre, envolto pelo saco pericárdico, com câmaras por onde circula o sangue do corpo. 

Deixo a sua imaginação pensar nas inúmeras complicações desse procedimento. Em segundo lugar: a história natural da miocardite é ser autolimitada! Quais as indicações, portanto, da BEM? Ela é recomendada para insuficiências cardíacas recentes com:

  • < 2 semanas,  fulminante, associada a instabilidade hemodinâmica OU;
  • 2 semanas a 3 meses, associado a: 

– Ventrículo esquerdo dilatado E novas arritmias (ventriculares, bloqueio AV de segundo grau Mobitz tipo II, bloqueio AV de terceiro grau) OU;

– Refratariedade ao suporte dentro de 1-2 semanas.

Terapias Específicas

Determinado o agente causador da miocardite, algumas terapias específicas podem ser instituídas:

  • herpes: aciclovir ou valaciclovir;
  • miocardite viral (Enterovírus, adenovírus ou parvovírus B19): interferon-beta;
  • miocardites linfocíticas ou de células gigantes e autoimunes (infecção negativa): imunossupressores (azatioprina, ciclosporina, micofenolato mofetil, associados a glicocorticóides);
  • miocardite eosinofílica, miocardiopatia crônica por sarcoidose: glicocorticóides;
  • miocardite aguda chagásica: benzonidazol.

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Referências

  1. Montera, Marcelo Westerlund et al. I Diretriz brasileira de miocardites e pericardites. Arquivos Brasileiros de Cardiologia [online]. 2013, v. 100, n. 4 suppl 1 [Acessado 14 Março 2022] , pp. 01-36. Disponível aqui. Epub 07 Jun 2013. ISSN 1678-4170.
  2. Velasco, I., Neto, R., Souza, H., Marino, L., Marchini, J. and Alencar, J., 2021. MEDICINA DE EMERGÊNCIA – ABORDAGEM PRÁTICA. 15th ed. São Paulo: Manole, pp.426-437.
  3. UpToDate. Uptodate.com. Disponível em aqui. Acesso em: 15 mar.  2022.
  4. UpToDate. Uptodate.com. Disponível em aqui. Acesso em: 15 mar.  2022.

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RodrigoFranco

Rodrigo Franco

Paraense, forjado em 1990. Residência em Clínica Médica pelo Hospital Israelita Albert Einstein (HIAE). Neto de professor que me transferiu o amor pelo magistério. Apaixonado pelo raciocínio clínico, por uma boa resenha, viagens e novas experiências. Siga no Instagram: @rodrigocfranco