Hoje vamos falar sobre as complicações da nutrição parenteral. Uma nutrição adequada é associada a melhores desfechos clínicos importantes, como tempo de ventilação mecânica, tempo de cuidados intensivos e risco de infecções hospitalares.
Porém, embora seja frequente e benéfico o uso de NPT, há consequências e complicações negativas que devem ser conhecidas e consideradas. Neste artigo, vamos discutir as principais delas.
Primeiramente, devemos sempre ter em mente que as complicações da NPT podem ser evitadas ou, pelo menos, rapidamente tratadas através de uma monitorização pormenorizada do paciente.
É importante a avaliação cuidadosa: do balanço hídrico, dos distúrbios hidroeletrolíticos (cálcio, magnésio, fosfato, sódio, potássio), níveis glicêmicos e lipídicos.
É recomendável que os eletrólitos sejam medidos até que estejam estáveis e que seja feita a dosagem de aminotransferases, bilirrubina e triglicerídeos pelo menos uma vez por semana durante o tratamento.
Medimos oligoelementos, incluindo ferro, aproximadamente a cada três meses, ou se houver suspeita de deficiência. Assim, não prescreva nutrição parenteral ao paciente se você não dispor de condições de monitorização adequada do doente.
Isso porque é comum a associação da nutrição parenteral com alterações metabólicas, tais como:
Por isso, a monitorização frequente e regular é fundamental.
Agora, vamos conhecer as complicações mais comuns e como lidar com cada uma delas.
Como sabemos, o acesso venoso de localização central é requerido para a administração de NPT, seja inserido diretamente em veia central, tunelizado ou de inserção periférica.
Os pacientes em NPT, provavelmente pelo manejo mais frequente do dispositivo, têm um risco ligeiramente aumentado de adquirir uma infecção da corrente sanguínea (bacteriana e fúngica; aproximadamente um episódio a cada 100 dias de NP em paciente internado).
Essa complicação está diretamente relacionada à qualidade do cuidado: a higiene adequada das mãos e as precauções máximas de barreira durante a inserção do cateter venoso central são fundamentais para evitá-la.
As manifestações são as clássicas de infecções (febre, instabilidade hemodinâmica e alterações do estado mental), além de sinais flogísticos locais e coágulos intraluminais.
O diagnóstico é feito por resultados de hemoculturas aspiradas do cateter. Os germes mais comumente envolvidos são estafilococos coagulase-negativos, Staphylococcus aureus, enterococos ou espécies de Candida.
Essa é uma complicação importante e grave, visto que pode ainda causar endocardite infecciosa, tromboflebite séptica e infecção musculoesquelética metastática.
A hiperglicemia é a mais comum e relaciona-se com predisposição a infecções (diminuindo a capacidade de opsonização e reconhecimento de antígenos), polineuropatias (por inibir a captação de glicose pelos tecidos) e disfunção de múltiplos órgãos (por fosforilação oxidativa da estrutura mitocondrial).
Portanto, deve-se realizar um controle glicêmico intensivo, recomendando-se aferir a cada 4 ou 6h e mantendo-se a meta entre 140-180 mg/dL. Diabéticos descontrolados podem ter controles menos rigorosos.
Esquemas de insulina subcutâneos e endovenosos devem ser utilizados para um manejo adequado. Em casos extremos, a NP pode resultar em coma não cetótico hiperosmolar e hiperglicêmico.
A síndrome de realimentação é uma das consequências mais graves e dramáticas de uma NPT inadequadamente prescrita. A incidência exata não é conhecida, devido a uma considerável heterogeneidade de estudos.
Ela ocorre quando é reiniciada a alimentação de pacientes gravemente desnutridos (alcoólatras, anorexos, pacientes com diarreia crônica, vômitos ou fístulas).
A consequência principal é uma gama de distúrbios hidroeletrolíticos, principalmente hipofosfatemia grave. hipocalemia, hipomagnesemia e encefalopatia de Wernicke.
A ingestão suficiente de tiamina deve ser estabelecida antes da NPT. O desfecho inclui disfunções hemodinâmicas, neurológicas e respiratórias graves. Por isso, a progressão calórica da NPT deve ser lenta e regularmente reavaliada.
A infusão lipídica pela parenteral pode gerar agravamento ou início de hipertrigliceridemia. Ela é encontrada em aproximadamente 25-50% dos pacientes. Concentrações de até 400 mg/dL são aceitáveis durante a terapia sem alterar a taxa de lipídios.
Entretanto, doses de emulsão lipídica devem ser reduzidas quando as concentrações de triglicerídeos subirem acima de 400 mg/dL (por exemplo, uma ou duas vezes por semana).
Também é razoável tentar diminuir a proporção de calorias fornecidas pela dextrose. Níveis >1000 mg/dL são uma contraindicação à infusão.
Outras complicações metabólicas e hepáticas incluem:
O fígado gorduroso é a complicação mais comum, enquanto a colestase intra-hepática ou a hepatite são menos frequentes. As complicações hepáticas são particularmente frequentes em pacientes pediátricos.
Usualmente, os pacientes em uso de NPT apresentam anasarca por excesso de volume administrado e hipoalbuminemia grave.
Durante a primeira semana de NP, a ingestão hídrica deve ser limitada a aproximadamente 800 ml/dia mais a compensação das perdas insensíveis, evitando, assim, a sobrecarga hídrica e a desidratação.
O monitoramento diário do peso corporal pode ajudar a determinar o volume de fluido necessário. Um balanço hídrico diário rigoroso deve ser feito e um ganho de peso >0,25 kg/dia ou 1,5 kg/semana provavelmente é indicativo de acúmulo de líquidos e não de um estado nutricional melhorado.
Paciente com síndrome do intestino curto, pancreatite prolongada, doenças inflamatórias intestinais graves, etc., podem fazer uso prolongado de parenteral. Nesses casos, determinados metabólitos do metabolismo ósseo devem ser monitorados.
A manutenção do metabolismo ósseo fisiológico requer concentrações séricas adequadas de vitamina D, cálcio, magnésio e fosfato.
Em pacientes com NP de longo prazo, podem ocorrer distúrbios graves resultando em osteoporose e fraturas. Os substratos administrados por via parenteral ou infusão cíclica favorecem a excreção renal de cálcio.
Esperamos ter esclarecido as dúvidas em torno das complicações da alimentação parenteral. Aqui, no nosso blog, disponibilizamos uma série de conteúdos sobre Medicina de Emergência e residência médica para contribuir com sua preparação.
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1. Hartl WH, Jauch KW, Parhofer K, Rittler P; Working group for developing the guidelines for parenteral nutrition of The German Association for Nutritional Medicine. Complications and monitoring – Guidelines on Parenteral Nutrition, Chapter 11. Ger Med Sci. 2009;7:Doc17. Published 2009 Nov 18. doi:10.3205/000076
2. Uptodate: Nutrition support in critically ill patients: Parenteral nutrition. David Seres.
Graduada em Medicina pela Universidade Federal de Uberlândia. Clínica Média pela mesma instituição e Gastroenterologia pela USP-RP.