Imagine um hospital com corredores movimentados, onde cada médico em formação escolheu sua especialidade por afinidade, vocação, oportunidade e perspectiva de futuro. Agora, imagine que em outras alas existem poucas vagas preenchidas. O informe técnico de novembro de 2024 relacionado à Demografia Médica se propõe a mostrar esse cenário por meio do número de residentes médicos distribuídos pelo Brasil.
Mais do que uma simples estatística, a distribuição dos médicos residentes pelo país revela tendências profundas sobre o que atrai ou afasta os profissionais em formação. Quais especialidades médicas concentram mais residentes? Quais quase não conseguem preencher suas vagas? E o que isso pode significar para o futuro da assistência à saúde no Brasil?
Nesse post, vamos explorar esses dados e entender o que está por trás das escolhas dos médicos recém-formados e o que isso quer dizer sobre o cenário da saúde em nosso país. Continue a leitura!
A residência médica é a principal porta de entrada para a especialização no Brasil. A forma como os médicos são distribuídos entre as áreas de atuação afeta diretamente o acesso da população a diferentes tipos de atendimento, a eficiência do sistema de saúde e o equilíbrio entre a oferta e a demanda por serviços especializados.
Sendo assim, compreender o número de residentes médicos pelo país ajuda:
A Demografia Médica, realizada pela Faculdade de Medicina da USP em parceria com o CFM, mostrou que algumas especialidades continuam sendo as mais procuradas ano após ano. São áreas com grande campo de atuação, forte demanda na rede pública e privada, e geralmente com um fluxo intenso de pacientes nos hospitais-escola.
A Clínica Médica lidera o ranking com maior número de residentes médicos. É uma especialidade base, essencial para a formação em áreas como Cardiologia, Gastroenterologia, Nefrologia e Oncologia. A ampla empregabilidade e a possibilidade de atuar em diferentes contextos, de ambulatórios a emergências, explicam sua popularidade.
Além disso, é comum que muitos médicos escolham Clínica Médica como uma etapa intermediária. Depois, podem buscar subespecializações mais específicas.
A segunda especialidade com mais residentes é a Pediatria. O cuidado com a saúde infantil continua sendo uma prioridade para o sistema público de saúde, o que garante ampla demanda por pediatras.
Apesar de ser uma área exigente emocionalmente, o vínculo com os pacientes e a possibilidade de impactar vidas desde o nascimento são fatores que continuam atraindo médicos para essa especialidade.
A Cirurgia Geral também se mantém entre as especialidades mais procuradas. A formação exige dedicação, habilidades técnicas apuradas e resistência física, mas oferece amplo reconhecimento e oportunidades de atuação.
Muitos residentes usam a Cirurgia Geral como base para avançar em outras áreas mais específicas. Por exemplo, Cirurgia Vascular, Cirurgia Oncológica ou Cirurgia do Aparelho Digestivo.
Na quarta posição, a Ginecologia e Obstetrícia reúne mais de 4.000 médicos residentes. É uma das especialidades que mais lida com a vida em sua forma mais sensível: o nascimento. O papel da G.O. é central tanto na atenção básica à saúde da mulher quanto em procedimentos de alta complexidade.
Apesar dos desafios, como plantões noturnos e o risco de processos jurídicos, o aspecto humano da prática continua sendo um grande atrativo.
A Anestesiologia completa a lista das cinco especialidades mais procuradas. A área cresceu muito nas últimas décadas, acompanhando o avanço das técnicas cirúrgicas e a valorização do conforto e segurança dos pacientes durante os procedimentos.
Além disso, é uma especialidade bem remunerada. Por este motivo, tem atraído cada vez mais jovens médicos em busca de uma carreira técnica, estável e valorizada.
Se por um lado algumas especialidades enfrentam superlotação, outras continuam com baixa procura, e muitas vezes têm vagas ociosas mesmo em programas de instituições de prestígio. Os motivos vão desde o desconhecimento até questões como baixa remuneração, pouca valorização social ou rotinas restritas. Veja a lista a seguir!
Com menos de 100 médicos residentes em todo o país, a Angiologia é a especialidade que cuida das doenças vasculares, como varizes, tromboses e insuficiências venosas. Apesar de sua importância, a área disputa espaço com a Cirurgia Vascular, que oferece maior variedade de procedimentos cirúrgicos.
O baixo número de residentes pode estar relacionado à sobreposição de competências e à pouca exposição dos estudantes à especialidade durante a graduação.
Também com menos de 100 residentes pelo Brasil, a Medicina do Tráfego é uma especialidade pouco conhecida entre os estudantes. Atua na prevenção de acidentes, perícias e promoção da saúde no trânsito. A baixa procura pode ser atribuída à pouca divulgação e à percepção de uma atuação muito restrita.
É uma área com importância crescente, especialmente frente ao aumento dos acidentes de trânsito, mas ainda pouco valorizada.
A Homeopatia é outra especialidade que continua com baixa adesão. Apesar de reconhecida como especialidade médica no Brasil, a área enfrenta resistência tanto dentro da comunidade médica quanto entre os pacientes, sobretudo devido à sua abordagem não convencional e à ausência de evidências científicas robustas.
A Patologia Clínica tem papel essencial nos bastidores da Medicina: é ela que garante diagnósticos precisos por meio de exames laboratoriais. Apesar disso, o contato limitado com os pacientes e a pouca visibilidade da atuação acabam afastando os recém-formados.
A especialidade exige grande domínio técnico, mas costuma ser esquecida entre os estudantes durante a graduação. Então, se você ainda está na faculdade, quem sabe pode começar a se interessar pela área e descobrir de perto as possibilidades que ela oferece.
Fechando a lista, temos a Medicina Legal e a Perícia Médica. A atuação envolve laudos, perícias e avaliações forenses, sendo fundamental em processos judiciais e na interface entre Medicina e Direito, algo que embora não vejamos de imediato, é mais comum do que imaginamos.
O baixo interesse pode estar relacionado ao perfil muito específico da área e à escassez de programas de residência bem estruturados. Pode ser que, com o passar do tempo, essa perspectiva mude para melhor.
A comparação entre as especialidades com maior e menor número de residentes médicos permite observar padrões que vão além dos números. Eles apontam para aspectos culturais, econômicos e estruturais da formação médica no país. Saiba mais!
As especialidades mais procuradas são aquelas tradicionalmente valorizadas tanto pelo mercado quanto pela sociedade. Clínica Médica, Pediatria e Cirurgia Geral são amplamente reconhecidas e oferecem múltiplas possibilidades de atuação, tanto no setor público quanto no setor privado.
Como você viu, há também o fator “porta de entrada”: especialidades como Clínica Médica e Cirurgia Geral funcionam como caminhos para subespecializações que são ainda mais valorizadas, como Cardiologia ou Cirurgia Plástica.
Esse fenômeno contribui para a manutenção de um ciclo onde determinadas áreas continuam recebendo mais investimentos e estrutura, enquanto outras permanecem invisíveis para a maioria dos médicos em formação.
As especialidades com menor número de residentes médicos enfrentam o duplo desafio de atrair novos médicos e garantir programas de qualidade. A pouca visibilidade durante a graduação, a baixa remuneração e a percepção de um mercado restrito são fatores que afastam os estudantes.
Além disso, a concentração dos programas em grandes centros urbanos pode dificultar o acesso para médicos de outras regiões, contribuindo ainda mais para a desigualdade na distribuição desses profissionais pelo país.
Políticas públicas de incentivo, bolsas, valorização profissional e maior integração com a formação geral dos médicos são caminhos possíveis para reverter esse quadro. É preciso, contudo, acompanhar de perto se essas mudanças estão ocorrendo e estar preparado para cobrar as autoridades responsáveis.
A escolha de uma especialidade médica é um momento decisivo na trajetória de qualquer médico. Os dados da Demografia Médica revelam preferências individuais e também um retrato da formação médica no Brasil, com suas fortalezas, lacunas e oportunidades.
Enquanto algumas especialidades seguem superlotadas, outras enfrentam desafios para atrair e formar novos especialistas. É importante lembrar, porém, que esse panorama afeta os profissionais, os pacientes e o sistema de saúde como um todo.
Portanto, conhecer esses números é o primeiro passo para transformar esse cenário. Seja você um estudante de Medicina e futuro residente, um médico já especializado, um gestor público, ou uma pessoa que quer atuar em um cenário de saúde mais equilibrado e acessível.
Se você gostou de saber mais sobre o número de residentes médicos no Brasil, lembre-se de que essas estatísticas mudam todo ano.
Por isso, continue a se atualizar sobre esse e outros assuntos do mercado de trabalho em nosso blog!
Professor da Medway. Formado pela Escola de Medicina da Santa Casa de Misericórdia de Vitória-ES, com Residência em Medicina de Família e Comunidade pela USP-RP. Capixaba, flamenguista e apaixonado por samba. Siga no Instagram: @padilha.medway