Anticonvulsivantes na gestação: tudo que você precisa saber

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Fala galera! Nesse artigo iremos desvendar o uso de anticonvulsivantes na gestação: um assunto polêmico e temido na prática da obstetrícia. O objetivo, portanto, é facilitar sua prática diária e/ou garantir a tão sonhada aprovação nas provas de residência médica. Vamos juntos?

Revisando a epilepsia na gestação

A epilepsia pode ser caracterizada como um distúrbio neurológico capaz de predispor a crises epilépticas recorrentes, oriundas de uma descarga neuronal anormal

Eu sei que você já aprendeu como manejar uma crise convulsiva no PS (para população geral), então não perca a oportunidade de revisar esse conteúdo. 

O estudo dessa patologia na gravidez deve ser entendido como uma “via de mão dupla”: a epilepsia podem interferir no curso da gestação e influenciar negativamente no resultado perinatal; enquanto a gravidez, em consequência das modificações fisiológicas que ocorrem no organismo materno, também pode impactar na história natural da doença neurológica. 

Ao manejar pacientes gestantes portadoras de epilepsia devemos buscar um equilíbrio: elas devem ser mantidas sem crises convulsivas e, concomitantemente, os efeitos adversos dos anticonvulsivantes devem ser evitados. 

Qual o motivo para tanto medo dos anticonvulsivantes na gestação? 

Um dos principais efeitos colaterais dos medicamentos anticonvulsivantes é o risco de malformação fetal congênita e por isso o uso desses compostos é tão temido. 

Conhecer a ação desses fármacos e as indicações precisas para o tratamento é tarefa fundamental. Não devemos banalizar os possíveis efeitos colaterais, mas tampouco devemos deixar uma gestante sem tratamento, pois sabemos que a a epilepsia está associada a uma série de resultados perinatais adversos, como maior incidência de pré-eclâmpsia, trabalho de parto prematuro, aborto, descolamento prematuro da placenta, restrição do crescimento fetal, prematuridade e morte materna e ou fetal, descritos na tabela 1. 

Tabela 1. Complicações e desfechos desfavoráveis da epilepsia no ciclo gravídico-puerperal

COMPLICAÇÕES E DESFECHOS DESFAVORÁVEIS
MaternasPré- eclâmpsia
Trabalho de parto prematuro
Sangramento obstétricos 
Aborto
Descolamento prematuro de placenta
Mortalidade materna
FetaisRestrição do crescimento fetal
Prematuridade
Óbito fetal

As principais malformações associadas ao uso de anticonvulsivantes são os defeitos do tubo neural, as malformações cardíacas, as malformações do trato urinário, as malformações esqueléticas e as anormalidades / fissuras orais.  

Sabemos que alguns fármacos dessa categoria apresentam maior risco de teratogenicidade do que outros. O valproato, por exemplo, está associado ao maior risco de malformações fetais, enquanto fenobarbital e topiramato estão associados a um risco intermediário e a lamotrigina está associada a um risco inferior. A politerapia e a dose do medicamento são outros fatores que também aumentam o risco de malformações fetais. 

A causa da teratogenicidade desses compostos ainda não é bem esclarecida. Alguns dos medicamentos são antagonistas de ácido fólico e podem ocasionar defeitos do fechamento do tubo neural. Outros mecanismos patogênicos descritos na literatura envolvem a produção exacerbada de radicais livres, estresse oxidativo e danos ao DNA. 

Especificando os anticonvulsivantes na gestação e escolhendo a melhor opção

Na tabela abaixo iremos descrever os principais anticonvulsivantes disponíveis no Brasil e as recomendações para uso (ou não) durante ciclo gravídico-puerperal. Sabemos que os estudos ainda são escassos e é difícil garantir a segurança de qualquer droga. 

Tabela 2. Anticonvulsivantes e efeitos adversos no ciclo gravídico-puerperal 

ANTICONVULSIVANTES NA GESTAÇÃO
DROGAEFEITOS 
ValproatoApresenta elevado risco de teratogenicidade. Seu uso está associado ao desenvolvimento de defeitos do tubo neural (exemplo: espinha bífida, mielomeningocele), fendas orais, malformações cardíacas e malformações urogenitais. 
Seu efeito depende da dose, porém não existe dose segura. 
Apresenta também um impacto no desenvolvimento neuropsicomotor do recém-nascido.
Deve ser evitado em mulheres com intenção reprodutiva. 
FenitoínaSeu uso está associado ao desenvolvimento de fendas orais, malformações cardíacas e urogenitais.
Fenobarbital Seu uso está associado ao desenvolvimento de fendas orais, malformações cardíacas e urogenitais. 
CarbamazepinaSeu uso está associado com modesta taxa de malformações gerais e maior risco de defeitos do tubo neural.
TopiramatoSeu uso está associado ao desenvolvimento de fissuras orais, restrição de crescimento e baixo peso ao nascer. 
LamotriginaOs dados disponíveis na literatura costumam ser tranquilizadores. 
O risco de malformação parece ser semelhante à população geral. É uma das drogas de escolha para pacientes em idade fértil com desejo reprodutivo. 
LevetiracetamEstá associado a um baixo risco de malformações em monoterapia. É uma das drogas de escolha para pacientes em idade fértil com desejo reprodutivo. 
OxcarbazepinaEstá associado a um baixo risco de malformações. 

A politerapia, especialmente quando envolve o uso do valproato, aumenta significativamente o risco de teratogenicidade, devendo ser evitada nas pacientes com idade fértil e desejo reprodutivo. 

Em geral, recomenda-se que a decisão terapêutica e a escolha do medicamento seja realizada no período pré-concepcional. Evitamos de alterar esquemas farmacológicos durante a gestação, pois sabe-se que essa medida é pouco eficaz para redução de efeitos teratogênicos, além de poder prejudicar o controle da doença materna. 

Devido ao fato de alguns medicamentos anticonvulsivantes reduzirem a absorção do ácido fólico, recomenda-se a suplementação do composto na dose de 5 mg ao dia durante toda a gestação. É uma das formas de prevenção dos defeitos do tubo neural. 

Ufa! Muita informação, não é mesmo? Aproveite algumas dicas para memorizar todas essas informações aqui. 

Para nunca mais esquecer anticonvulsivantes na gestação

A epilepsia não é uma condição clínica que contraindica a gestação. Porém, com a intenção de garantir desfecho adequado para o binômio materno-fetal, é fundamental que a paciente seja acompanhada por especialistas desde o período pré-concepcional. 

Em todos os estudos, o valproato está associado ao maior risco de malformações graves. Sabemos que para pacientes com epilepsia em idade fértil e que planejam engravidar, a lamotrigina ou monoterapia com levetiracetam são as melhores opções disponíveis

Para finalizar, tenho três dicas imperdíveis para você: 

  • Aproveitando a pegada de falar sobre doenças neurológicas na gravidez, sugiro que você leia este texto sobre enxaqueca em gestantes. 
  • Aproveite também que já decorou uma série de informações sobre os medicamentos anticonvulsivantes na gestação, e leia um pouco mais sobre analgésicos no ciclo gravídico-puerperal. 
  • Não deixe de conferir os cursos da Medway para aprender a forma certa de estudar e conquistar sua vaga na tão sonhada instituição!

Até a próxima pessoal! 

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AnuarSaleh

Anuar Saleh

Nascido em 1993, em Maringá, se formou em Medicina pela UEM (Universidade Estadual de Maringá). Residência em Medicina de Emergência pelo Hospital Israelita Albert Einstein.