Diverticulite aguda: conheça uma das causas de abdome agudo

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A diverticulite aguda é uma causa muito comum de abdome agudo. Esse assunto costuma aparecer nas provas de Clínica, Cirurgia e Prática Médica. Portanto, você não pode deixar passar na preparação.

Doença diverticular dos cólons

Antes de falarmos sobre a diverticulite propriamente dita, precisamos falar sobre a doença diverticular dos cólons. Portanto, conheça algumas definições a respeito da diverticulite aguda:

  • divertículos: protrusões da parede colônica. Quem tem divertículos tem diverticulose, e isso pode ser sintomático ou não;
  • doença diverticular: diverticulose clinicamente significante, com sangramento, inflamação, colite segmentar ou doença diverticular sintomática não complicada;
  • diverticulite: inflamação dos divertículos, podendo ser aguda, crônica, complicada ou não complicada.
  • doença diverticular sintomática não complicada: dor abdominal persistente na ausência de alterações macroscópicas de diverticulite ou colite.

Epidemiologia

Uma dúvida muito comum é: qual é a faixa etária mais comum acometida pela doença diverticular? Os idosos (mais de 60 anos) são os mais atingidos.

Todos os pacientes com diverticulose terão diverticulite? No geral, de 4% a 15% dos pacientes desenvolvem diverticulite. A maioria é homem, mas estudos recentes demonstram que a porcentagem entre homens e mulheres é cada vez mais próxima.

Quais são os fatores de risco da diverticulite aguda?

  • Relacionados à alimentação: dieta rica em carne vermelha e pobre em fibras, predisposição à constipação intestinal, que também é considerada fator de risco;
  • IMC menor ou igual a 25;
  • Tabagismo acima de 40 anos-maço;
  • Ausência de atividade física;
  • Medicações, como AINES ou opioides, aumentam o risco de sangramento e da diverticulite. Por outro lado, as estatinas parecem ser fatores protetores, assim como níveis elevados de vitamina D, que parecem reduzir o risco de internação por diverticulite.

Como os divertículos se formam?

Você se lembra da anatomia? A parede colônica tem alguns pontos de “fraqueza”, que são justamente onde os vasa-recta penetram na camada circular do cólon. Os divertículos se formam nesses pontos. 

Lembra daquela história de divertículos falsos ou verdadeiros? Aqui eles são considerados falsos, pois a mucosa e a submucosa estão cobertas apenas pela serosa. 

Dessa forma, o aumento de pressão intraluminal predispõe a formação deles. Esse aumento pode ocorrer por disfunção de motilidade, como na constipação intestinal, por exemplo.

Como a diverticulite aguda ocorre?

O ponto principal para o processo é que ocorrem micro ou macroperfurações na parede do divertículo. Antes, acreditava-se que a causa das perfurações eram obstruções por fecalitos, mas, com o tempo, viram que não era tão comum assim.

A erosão da parede do divertículo ocorre tanto por aumento da pressão intraluminal colônica quanto por partículas dos próprios alimentos. Geralmente, causa uma perfuração pequena. A própria gordura pericólica e o mesentério conseguem isolar o processo, fazendo uma inflamação localizada.

Ainda assim, há riscos de complicação, pois pode ocorrer formação de abscesso, inclusive com ruptura, podendo causar peritonite localizada ou generalizada.

Quadro clínico

Como era de esperar, dor abdominal é o mais comum, sobretudo, do lado esquerdo, pois o sigmoide é um dos locais mais acometidos. De modo usual, é constante, ou seja, muitos pacientes relatam dor semelhante previamente. Observe os seguintes pontos:

  • náuseas e vômitos em 20% ou 60% dos pacientes;
  • febre baixa;
  • massa palpável, podendo indicar inflamação pericólica ou abscesso peridiverticular;
  • história de alteração de hábito intestinal: constipação em 50% e diarreia em 20% ou 25% dos casos;
  • de 10% a 15% dos pacientes podem ter sintomas urinários, com urgência ou dor suprapúbica, por inflamação local por contiguidade;
  • caso haja instabilidade hemodinâmica e hipotensão, pense em ruptura com peritonite.

Complicações agudas

Você sabe quais são os sintomas da diverticulite? Ela pode se manifestar de diversas formas. Conheça as principais complicações agudas que podem surgir nos pacientes:

  • abscesso local: ocorre em 17% dos pacientes internados por diverticulite;
  • obstrução intestinal: suboclusão é mais comum que obstrução total;
  • formação de fístulas: colovesical (desconfiar se pneumatúria, fecalúria ou disúria) ou colovaginal;
  • perfuração: causada por ruptura do abscesso para cavidade peritoneal.

Quando falamos em perfuração, temos que saber sobre a classificação de Hinchey. Confira abaixo:

  • Hinchey 1: abscesso pericólico ou mesentérico
  • Hinchey 2: abscesso pélvico;
  • Hinchey 3: peritonite purulenta generalizada;
  • Hinchey 4: peritonite fecal generalizada.

Achados laboratoriais

No que tange os achados laboratoriais, não temos nada muito específico. Pode ocorrer elevação de PCR e leucocitose pelo quadro inflamatório. Além disso, a urina 1 pode ter piúria pela inflamação adjacente, mas se tiver urocultura positiva com flora colônica, pense na possibilidade de fístula colovesical.

Qual exame de imagem solicitar?

Nesse caso, o exame de escolha é a tomografia computadorizada de abdome com contraste. Ela tem sensibilidade de 94% e especificidade de 99%. Além de fazer o diagnóstico, já é possível dizer se existem complicações.

Se não tiver TC de abdome disponível, a ultrassonografia do abdome costuma ajudar. Quando realizada adequadamente, em aparelhos de alta resolução, pode ter sensibilidade de especificidade semelhante à tomografia.

Tratamento da diverticulite aguda

É válido salientar que nem todos os pacientes devem ser internados. O tratamento deve ser hospitalar sempre que presenciar casos de diverticulite complicada. Nos casos de diverticulite não complicada, interne pacientes com:

  • sinais de sepse;
  • microperfurações/formação de flegmão;
  • imunossupressão: diabetes mal controlada, doença renal crônica em uso de corticoide, outros imunossupressores, HIV, linfomas;
  • febre alta, maior que 39°C;
  • leucocitose;
  • sinais de peritonite (mesmo que TC não demonstre complicações);
  • idade maior que 70 anos;
  • impossibilidade de realizar tratamento via oral;
  • falha de tratamento prévio.

Como realizar o tratamento ambulatorial?

O tratamento ambulatorial da diverculite aguda deve ser feito entre sete e dez dias, cobrindo gram-negativos e anaeróbios, principalmente Escherichia coli e Bacteroides fragillis:

  • ciprofloxacino 500 mg de 12/12 horas VO + metronidazol 500 mg de 8/8 horas VO;
  • levofloxacino 750 mg/dia + metronidazol 500 mg VO de 8/8 horas;
  • sulfametoxazol + trimetoprima (800/160 mg) de 12/12 horas + metronidazol 500 mg VO de 8/8 horas;
  • amoxicilina + clavulanato (875 mg/125 mg) VO de 8/8 horas;
  • se intolerância a metronidazol e beta-lactamicos, moxifloxacino 400 mg ao dia.

No tocante à dieta, não há orientação específica para os pacientes com diverticulite aguda não complicada. Se esses pacientes não apresentarem piora clínica, não é preciso repetir imagem.

Tratamento hospitalar

Como são pacientes mais graves, iniciar antibioticoterapia endovenosa o mais rápido possível, com tratamento empírico. A duração do tratamento varia, mas, em geral, dura de 10 a 14 dias. Algumas opções são:

  • piperacilina + tazobactam 3,5g, EV, de 6/6 horas;
  • meropenem 1 g EV de 8/8 horas;
  • cefazolina 1-2 g EV de 8/8 horas + metronidazol 500 mg EV de 8/8 horas;
  • ceftriaxona 2 g por dia EV + metronidazol 500 mg EV de 8/8 horas;
  • ciprofloxacino 400 mg EV de 12/12 horas + metronidazol 500 mg EV de 8/8 horas.

Além da antibioticoterapia, não esqueça de garantir a estabilidade hemodinâmica, com hidratação endovenosa, com ringer lactato ou soro fisiológico 0,9%.

Se não existir melhora após dois ou três dias de antibioticoterapia, repita a imagem para avaliar novas complicações. Complementarmente, em caso de abscessos maiores ou iguais a 4 cm, é possível realizar drenagem percutânea guiada por USG ou TC para auxiliar no tratamento clínico.

Quando o tratamento cirúrgico é necessário?

O tratamento cirúrgico é reservado para alguns casos de diverticulite aguda complicada. Porém, vale tomar cuidado, pois microperfurações ou perfurações Hinchey 1 ou 2 podem ser tratadas clinicamente. Já nas perfurações Hinchey 3 ou 4, há necessidade de abordagem cirúrgica.

Em pacientes com Hinchey 4 (peritonite fecal generalizada), geralmente, é realizada a cirurgia de Hartmann (ressecção do segmento colônico, com realização de colostomia e fechamento do reto. Apenas em um segundo momento, é realizada a anastomose). Isso é feito, pois o risco de deiscência de uma anastomose primária no momento inicial é muito alto.

Em pacientes hemodinamicamente instáveis, com múltiplas comorbidades e risco cirúrgico muito elevado, é possível realizar cirurgia de controle de danos, a partir da qual se realiza lavagem da cavidade peritoneal. Em um primeiro momento, apenas no “second look”, é realizada a ressecção colônica e o fechamento da parede abdominal.

Entretanto, nem sempre a cirurgia tem que ser de urgência. Pode ser feita de forma eletiva naqueles pacientes com diverticulite recorrente, com comprometimento de qualidade de vida ou risco de desenvolver complicações graves (como imunossuprimidos).

Segmento: nunca se esqueça da colonoscopia

Sempre descarte o câncer colorretal nesses pacientes. Solicite colonoscopia após seis ou oito semanas do quadro agudo, quando a inflamação já reduziu.

Índice de mortalidade da diverticulite aguda

Isso depende muito das complicações e das comorbidades. Quanto há diverticulite aguda não complicada, o tratamento clínico conservador é bem-sucedido entre 70% a 100% dos casos.

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IsabellaSilvestre Ignarro

Isabella Silvestre Ignarro

Nascida em Ourinhos, interior de São Paulo em 1992. Formada em medicina em 2018, pela Pontifícia Universidade Católica de Campinas. Residência em Clínica Médica na Universidade Estadual de Campinas.