Pneumoperitônio e suas causas: tudo que você deve saber

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Bora pra mais um tema de Cirurgia aqui no blog da Medway! Hoje vamos abordar um assunto super interessante: as causas do pneumoperitônio

A primeira coisa em que você deve ter pensado é no abdome agudo perfurativo, né? Então, você está certíssimo! Mas aqui, vamos te mostrar as outras causas que podem aparecer.

Pneumoperitônio: definição

Pneumoperitônio nada mais é que ar livre na cavidade abdominal, podendo ser resultado de perfuração, isquemia, erosão, neoplasia e infecção. 

Muitas vezes, você vai diagnosticar o pneumoperitônio por um achado em exame de imagem, já em outras, vai encontrar aquele clássico quadro clínico do abdome agudo perfurativo.

Hora de refrescar a memória! Este é o quadro clássico de um abdome agudo perfurativo:

  • dor súbita, intensa; 
  • abdome em tábua;  
  • peritonite; 
  • sinal de Jobert – perda da macicez hepática durante a percussão. 

Quando esse quadro exuberante do abdome agudo perfurativo não aparece, o pneumoperitônio é encontrado por exame de imagem. A seguir, vamos ver alguns exemplos disso.

Pneumoperitônio no exame de imagem

O clássico achado do pneumoperitônio é o que vemos na imagem acima. As setas demonstram uma lâmina formada pelo ar livre que se acumula entre o estômago, fígado e as cúpulas diafragmáticas.

Além desse achado, também temos o sinal de Rigler, que é a visualização da parede intestinal pela presença de gás dentro da alça e fora na cavidade abdominal. Na imagem apontada pela seta, podemos ver a alça colônica bem desenhada pelo ar circundante.

Nessa tomografia também conseguimos ver o pneumoperitônio apontado pela seta em torno do fígado.

Causas

Agora que já revisamos a definição, quadro clínico e apresentação radiológica, bora falar do nosso foco, que são as causas de pneumoperitônio

Nós dividimos as causas entre cirúrgicas e não cirúrgicas, por isso, além de uma radiografia simples evidenciado o pneumoperitônio, precisamos fazer uma anamnese bem detalhada, perguntando antecedentes relevantes e um exame físico minucioso. 

Caso contrário, vamos sair operando todo mundo baseado em uma imagem.

CAUSAS NÃO CIRÚRGICAS
TorácicaDPOCVentilação mecânicaRuptura de traqueia
AbdominalPós operatório de videolaparoscopiaPeritonite bacteriana espontâneaGastrostomia percutânea endoscópicaPneumatose cística intestinal Diálise peritoneal
GinecológicaInstrumentação vaginal
OutrasAmiloidoseMergulhoUso de cocaína

Essa tabela representa apenas algumas das causas não cirúrgicas de pneumoperitônio, e como vocês podem ver, a maioria delas pode ser detectada tirando uma história detalhada do paciente. 

Mas como estamos em um texto de Cirurgia, vamos gastar um pouquinho mais de tempo nas causas que exigem uma conduta cirúrgica subsequente. Vamos revisar cada ponto em que pode ocorrer uma perfuração e entender a apresentação clínica e as etiologias por trás dela.

Causas cirúrgicas de pneumoperitônio

Perfuração esofágica

Frente a uma perfuração do esôfago abdominal, nosso paciente pode se apresentar com disfagia, dispneia, enfisema subcutâneo ou dor epigástrica.

Mas o que poderia causar uma perfuração esofágica?

  • lesão endoscópica; 
  • trauma; 
  • neoplasias; 
  • dilatação pneumática do esôfago – feita na cardiomiotomia para abordagem cirúrgica de acalásia; 
  • balão de Sengstaken Blakmore – quando deixado por mais de 24 horas; 
  • Síndrome de Boerhaave – ruptura esofágica após vômitos excessivos representada na imagem abaixo.

Perfuração gástrica/duodenal

Quando falamos da perfuração nessa região, o paciente vai apresentar, na maioria das vezes, aquele quadro clássico de abdome agudo perfurativo. 

Existem diversas etiologias por trás disso, como neoplasias, perfuração após um procedimento endoscópico, etc. Porém, a grande estrela por trás de tudo isso são as úlceras pépticas perfuradas.

Atualmente, as úlceras pépticas compõem 75% dos casos de perfuração na região do estômago e duodeno. 

Apesar dos inibidores de bomba de prótons terem reduzido significativamente, vemos vários casos no pronto-socorro de pacientes com abdome agudo perfurativo secundário a uma úlcera péptica perfurada. 

Nessa imagem, por exemplo, vemos uma perfuração de duodeno por conta de uma úlcera péptica: 

Fonte: https://www.sciencedirect.com/science/article/pii/S2213576613001176

Perfuração de intestino delgado

Falando de outras partes do intestino delgado, podemos ressaltar 2 causas importantes:

  • Divertículo de Meckel; 
  • Isquemia mesentérica. 

O divertículo de Meckel é uma má formação do intestino delgado, em que há formação de um divertículo na região ileal que pode conter tecido semelhante ao estômago e ao pâncreas.

Fonte: https://www.msdmanuals.com/pt/casa/problemas-de-saúde-infantil/distúrbios-digestivos-nas-crianças/divertículo-de-meckel

Ao apresentar tecido gástrico, pode haver secreção de ácido clorídrico e formação de úlceras pépticas, além da posterior perfuração dela. Mas esse não é o mecanismo mais comum que leva a esse tipo de complicação. 

O que ocorre com mais frequência é uma inflamação do divertículo que pode complicar com perfuração (semelhante a um quadro de apendicite aguda) e os sintomas vão cursar com aquele quadro clássico de abdome agudo perfurativo.

Já na isquemia mesentérica, temos uma interrupção de suprimento sanguíneo para um segmento do intestino delgado. Tal região apresenta um sofrimento intestinal, cursando com necrose e até mesmo perfuração.

A apresentação clínica já é um pouco diferente: nosso paciente cursa com uma dor abdominal importante, mas um exame físico sem muitos achados importantes. 

É essencial que, nesses casos, seja investigada a causa dessa isquemia, seja uma trombose ou êmbolo. Também devemos tratar de acordo, com uma abordagem cirúrgica para ressecar a alça isquêmica.

Perfuração colorretal

Por fim, mas não menos importante, vamos falar das causas de perfuração colorretal. São várias as causas que podem provocar essa condição, sendo as mais importantes:

  • neoplasia;
  • megacólon tóxico;
  • pós-colonoscopia;
  • colite isquêmica; 
  • apendicite aguda;
  • diverticulite aguda. 

As neoplasias são as mais frequentes dentre essas causas quando falamos de perfuração. O mecanismo por trás disso, frequentemente, é a complicação de um abdome agudo obstrutivo, a obstrução pode isquemiar a alça e, por consequência, perfurá-la. 

O megacólon tóxico é uma resposta inflamatória exacerbada secundária à retocolite ulcerativa ou infecção por Clostridium difficile, entre outras. O produto disso é um cólon extremamente dilatado e inflamado, como vocês podem ver na imagem a seguir. Alguma dúvida de que isso pode perfurar?

Fonte: https://www.researchgate.net/figure/Figura-4-Imagen-de-megacolon-durante-el-transoperatorio_Sfig2_350672051

Apendicite e diverticulite aguda são causas também muito comuns em nosso meio e, inclusive, a perfuração já se encontra dentro das classificações dessas condições. Uma apendicite fase IV e diverticulite aguda Hinchey 3/4 incluem a perfuração.

Referências

Tanner NT, Hall BR, Oran J. Pneumoperitoneum. Surg Clin N Am 98 2018; 915–932

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DanielHaber Feijo

Daniel Haber Feijo

Nascido em São Paulo, criado em Belém do Pará. Formado médico pela Universidade do Estado do Pará e Cirurgião Geral pela Escola Paulista de Medicina/Universidade Federal de São Paulo (EPM-UNIFESP). Atualmente, profissional da área médica na assistência e no ensino. Segue apaixonado por administração, economia e finanças. A gente só tem aquilo que a gente aceita ter! Siga no Instagram: @danielhaberfeijo