Síndrome de Weil: um temido vilão no PS

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Fala, pessoal! Hoje o assunto de que vamos tratar é a Síndrome de Weil. Imagine a seguinte cena: um paciente é admitido para ser atendido no PS que você está de plantão. Logo que ele entra na sala, você percebe uma coloração alaranjada na esclera associada a uma queda do estado geral. Durante a entrevista, além das queixas perceptíveis na sua entrada ao consultório, ele refere um quadro febril associado à mialgia – especialmente em panturrilha, aumento do volume urinário e hemoptise. 

Então, diante de uma síndrome febril marcada com icterícia rubínica, alteração renal e algum grau de hemorragia, você reflete por um breve momento tentando lembrar a doença e… Síndrome de Weil. Mas antes de falar dos fins, que tal darmos alguns passos para trás antes de seguirmos adiante?

O que é a Síndrome de Weil?

A Síndrome de Weil é um espectro clínico da leptospirose – a famosa “doença do rato”. Ela é causada por uma bactéria chamada Leptospira interrogans e, como o apelido diz, seu hospedeiro natural é o rato. A contaminação acontece através do contato com líquido contaminado com urina de rato. A partir de então, a bactéria invade nossa pele e chega à corrente sanguínea. A maioria dos infectados produz uma resposta imune que é capaz de conter a infecção. No entanto, é possível que em alguns casos, a espiroqueta se aloje no tecido e realize uma migração transendotelial, causando uma vasculite.

Síndrome de Weil: confira uma imagem ilustrativa!
Figura 1. Disponível em: https://s.rfi.fr/media/display/a732faaa-537611ec-abfc005056a90284/w:1280/p:16×9/shutterstock_795465688_1280x730.jpg

Ok, tudo isso é teoria, mas como o paciente se apresenta? Veja bem, a fase precoce – ou leptospirêmica – é marcada por uma sintomatologia inespecífica. É possível que o paciente se apresente com febre, cefaleia, mialgia intensa, exantema, linfadenopatia e por aí vai. Até então, isso em nada ajuda, já que a lista de diagnósticos diferenciais é extensa. O pulo do gato é a epidemiologia. Será alguém com esse quadro clínico que frequentou algum ambiente que possua ratos, como lixões e enchentes?

Felizmente a maioria dos pacientes se apresenta dessa forma e, por vezes, a infecção é controlada pelo próprio organismo, antes mesmo de se realizar o diagnóstico. No entanto, alguns pacientes evoluem com a temida Síndrome de Weil. Aquela mesmo do começo da nossa discussão. Ela possui três grandes pilares: icterícia rubínica, insuficiência renal e hemorragias. Vamos destrinchar e entender o que acontece que justifica cada um dos sintomas?

Quais são os principais sintomas?

Pois bem, a icterícia rubínica tem um teor colestático. Acontece que a leptospira causa hepatotoxicidade e colestase. Laboratorialmente, há aumento de transaminases – especialmente a oxalacética pela soma da lesão muscular – associado ao aumento da bilirrubina direta. 

A insuficiência renal se dá por lesão tubular proximal. Há, então, disfunção com aumento de escórias nitrogenadas e perda eletrolítica – em especial de sódio. Para tentar contornar essa situação, o organismo reabsorve esse eletrólito às custas de espoliação de potássio. 

Por esse motivo, dizemos que se trata de uma insuficiência renal aguda hipocalêmica. Por fim, a hemorragia – principalmente pulmonar, mas podendo acometer todo o organismo – se dá por coagulopatia secundária à disfunção hepática, associada ao aumento da permeabilidade vascular e extravasamento do conteúdo intravascular.

E se você acha que acabou, você acabou de se enganar. Existe também, após fase precoce (7-10 dias), a fase tardia ou período de convalescença que pode cursar com as “ites”: miocardite, pericardite, pancreatite, encefalite, etc. Tenso, né? Essas evoluções são graves, e é possível que o tratamento tenha que ser feito dentro da Unidade de Terapia Intensiva, especialmente da Síndrome de Weil.

Como diagnosticar a Síndrome de Weil?

Você deve estar se perguntando: existem métodos de diagnóstico específicos para instituição de um tratamento precoce a fim de evitar toda essa tragédia? E mais: como eu trato isso? Pois bem, o diagnóstico pode ser feito pela detecção da espiroqueta através do PCR ou por detecção de anticorpos com o ELISA associado à confirmação com teste de microaglutinação – padrão ouro, uma vez que titula os anticorpos e identifica o sorotipo! E por se tratar de uma infecção bacteriana, o tratamento é feito com antibiótico

Para casos leves, usamos doxaciclina desde que o paciente esteja antes do 7º dia de sintoma. Esses pacientes devem ser reavaliados a cada 24 a 72 horas durante 2 semanas para termos certeza de que todo o período da doença passou e ele ficou bem. Casos graves devem ser hospitalizados, receber suporte hemodinâmico e tratados com penicilina cristalina ou ceftriaxone

Assunto tenso, né? Mas não tem jeito, amigo, tem que saber, ainda mais se um caso clássico de Síndrome de Weil se apresentar a você! Essa é apenas uma das buchas que podem aparecer no seu plantão. 

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Nos vemos na próxima. Valeu!

Colaborou para a produção deste artigo: Renata Cavalcanti

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AlexandreRemor

Alexandre Remor

Nascido em 1991, em Florianópolis, formado pela Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC) em 2015 e com Residência em Clínica Médica pelo Hospital das Clínicas da FMUSP (HC-FMUSP) e Residência em Administração em Saúde no Hospital Israelita Albert Einstein (HIAE). Fanático por novos aprendizados, empreendedorismo e administração. Siga no Instagram: @alexandre.remor