Abdome agudo perfurativo: a visão da radiologia

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Fala, pessoal! Tudo bem? Hoje vamos falar sobre a visão da radiologia para o tema do abdome agudo perfurativo. E aí, se interessa pelo tema e ficou animado para saber mais? Então, continue a leitura com a gente! Vamos lá! 

O que é abdome agudo perfurativo?

O abdome agudo perfurativo é uma emergência que pode ocorrer a partir de uma perfuração em qualquer ponto do trato gastrointestinal (TGI). 

A conduta padrão é a pronta realização de cirurgia, visto que o atraso no diagnóstico e tratamento aumenta significativamente a morbidade e mortalidade dos pacientes.

O diagnóstico do abdome agudo perfurativo é realizado, em grande parte, por meio dos métodos de imagem que auxiliam a confirmação da suspeita clínica, identificação do nível e, às vezes, da causa da perfuração para um planejamento cirúrgico e a realização de uma conduta adequada.

O abdome agudo perfurativo é considerado uma complicação potencial de várias doenças abdominais. Dentre elas, destacam-se a úlcera péptica, os eventos traumáticos, apendicite, inflamação, neoplasias e iatrogenias. 

Outras causas incluem ruptura de abscessos, obstrução intestinal, doença inflamatória intestinal e condições do trato genital feminino.

O prognóstico irá depender da etiologia, idade do paciente, local de perfuração e do tempo que leva do início dos sintomas até a cirurgia. Em relação às vísceras ocas, leva-se também em consideração o grau de contaminação peritoneal e o desenvolvimento de peritonite localizada ou generalizada.

Quadro clínico

O quadro clínico geralmente vai ser uma dor abdominal intensa, que inicialmente é localizada e depois se torna difusa, associada à possibilidade de desmaio e vômitos. 

É preciso ter uma atenção especial aos pacientes em uso de anti-inflamatórios que predispõem a ulcerações e perfurações da porção superior do TGI e podem ter os sinais e sintomas de peritonite mascarados. 

Algo semelhante ocorre com pacientes idosos e diabéticos, já que eles podem apresentar somente uma dor abdominal vaga ou um desconforto.

Exames de imagem

Em relação aos exames de imagem, a radiografia é considerada o primeiro exame a ser utilizado nos pacientes com suspeita de perfuração do TGI. E para prova de residência é importante conhecer alguns dos achados de pneumoperitônio que podemos encontrar nesse exame.

O primeiro deles é encontrado na radiografia do tórax em ortostase, em que podemos encontrar a presença de gás bilateral em forma de crescente na região inferior aos hemidiafragmas, podendo ocorrer, também, abaixo de somente um deles, geralmente à direita (FIGURA 1).

FIGURA 1 – Sinal da cúpula: radiolucência bilateral embaixo de ambos os hemidiafragmas que representa ar livre na cavidade peritoneal. Adaptado de Kasznia-Brown J, Cook C. Radiological signs of pneumoperitoneum: a pictorial review. Br J Hosp Med (Lond). 2006 Dec;67(12):634-9. doi: 10.12968/hmed.2006.67.12.224 (abdome agudo perfurativo)
FIGURA 1 – Sinal da cúpula: radiolucência bilateral embaixo de ambos os hemidiafragmas que representa ar livre na cavidade peritoneal. Adaptado de Kasznia-Brown J, Cook C. Radiological signs of pneumoperitoneum: a pictorial review. Br J Hosp Med (Lond). 2006 Dec;67(12):634-9. doi: 10.12968/hmed.2006.67.12.224

35.Na radiografia abdominal em decúbito, podemos encontrar o sinal de Rigler (FIGURA 2), um aumento da radiotransparência no abdome superior (FIGURA 3), o delineamento de ligamentos peritoneais e o sinal do triângulo (FIGURA 3).

FIGURA 2 – Sinal de Rigler (seta preta): gás delineando os dois lados da parede intestinal. Tênues radiolucências próximas a parede abdominal (setas brancas). Adaptado de Kasznia-Brown J, Cook C. Radiological signs of pneumoperitoneum: a pictorial review. Br J Hosp Med (Lond). 2006 Dec;67(12):634-9. doi: 10.12968/hmed.2006.67.12.22435.
FIGURA 2 – Sinal de Rigler (seta preta): gás delineando os dois lados da parede intestinal. Tênues radiolucências próximas a parede abdominal (setas brancas). Adaptado de Kasznia-Brown J, Cook C. Radiological signs of pneumoperitoneum: a pictorial review. Br J Hosp Med (Lond). 2006 Dec;67(12):634-9. doi: 10.12968/hmed.2006.67.12.22435.
FIGURA 3 – Aumento da radiolucência no quadrante superior direito do abdome (cabeça de seta branca) devido ao ar interposto entre a parede abdominal anterior e o fígado (seta branca). Ar acumulado no espaço de Morrison delineando a borda inferior do fígado (seta preta). Sinal do triângulo: ar livre entre as alças intestinais e a parede abdominal esquerda (cabeça de seta preta). Adaptado de Kasznia-Brown J, Cook C. Radiological signs of pneumoperitoneum: a pictorial review. Br J Hosp Med (Lond). 2006 Dec;67(12):634-9. doi: 10.12968/hmed.2006.67.12.22435. (abdome agudo perfurativo)
FIGURA 3 – Aumento da radiolucência no quadrante superior direito do abdome (cabeça de seta branca) devido ao ar interposto entre a parede abdominal anterior e o fígado (seta branca). Ar acumulado no espaço de Morrison delineando a borda inferior do fígado (seta preta). Sinal do triângulo: ar livre entre as alças intestinais e a parede abdominal esquerda (cabeça de seta preta). Adaptado de Kasznia-Brown J, Cook C. Radiological signs of pneumoperitoneum: a pictorial review. Br J Hosp Med (Lond). 2006 Dec;67(12):634-9. doi: 10.12968/hmed.2006.67.12.22435.

A tomografia computadorizada apresenta alta sensibilidade para o diagnóstico de pneumoperitônio e é considerada o método diagnóstico de escolha quando há suspeita de perfuração de víscera oca. 

É considerada um exame de boa acurácia para localização do sítio de perfuração, podendo detectá-lo em cerca de 85% dos casos.

Os achados diretos que confirmam a presença de perfuração incluem descontinuidade focal da parede intestinal, gás fora de alças e contraste entérico extraluminal quando administrado. 

Os indiretos incluem espessamento segmentar da parede intestinal, realce anormal da parede das alças, densificação da gordura perivisceral adjacente ou a presença de líquido e abscesso (FIGURAS 4, 5 e 6).

FIGURA 4 – Corte axial de tomografia demonstrando o antro gástrico espessado com extravasamento de contraste (cabeça de seta). Há acentuada quantidade de líquido livre e pequena quantidade de pneumoperitônio (seta). Adaptado de Del Gaizo AJ, Lall C, Allen BC, Leyendecker JR. From esophagus to rectum: a comprehensive review of alimentary tract perforations at computed tomography. Abdom Imaging. 2014 Aug;39(4):802-23.
FIGURA 4 – Corte axial de tomografia demonstrando o antro gástrico espessado com extravasamento de contraste (cabeça de seta). Há acentuada quantidade de líquido livre e pequena quantidade de pneumoperitônio (seta). Adaptado de Del Gaizo AJ, Lall C, Allen BC, Leyendecker JR. From esophagus to rectum: a comprehensive review of alimentary tract perforations at computed tomography. Abdom Imaging. 2014 Aug;39(4):802-23.
FIGURA 5 – Trauma: ferimento perfurante realizado por um objeto desconhecido. A: defeito focal ao longo da parede lateral do estômago (seta), em associação com extravasamento de contraste e gás (cabeça de seta). B: Imagem axial mais inferior que demonstra um acúmulo de contraste ao longo da margem inferior do baço (seta) e pequeno corpo estranho na trajetória da lesão perfurante (cabeça de seta). Adaptado de Del Gaizo AJ, Lall C, Allen BC, Leyendecker JR. From esophagus to rectum: a comprehensive review of alimentary tract perforations at computed tomography. Abdom Imaging. 2014 Aug;39(4):802-23. (abdome agudo perfurativo)
FIGURA 5 – Trauma: ferimento perfurante realizado por um objeto desconhecido. A: defeito focal ao longo da parede lateral do estômago (seta), em associação com extravasamento de contraste e gás (cabeça de seta). B: Imagem axial mais inferior que demonstra um acúmulo de contraste ao longo da margem inferior do baço (seta) e pequeno corpo estranho na trajetória da lesão perfurante (cabeça de seta). Adaptado de Del Gaizo AJ, Lall C, Allen BC, Leyendecker JR. From esophagus to rectum: a comprehensive review of alimentary tract perforations at computed tomography. Abdom Imaging. 2014 Aug;39(4):802-23.
FIGURA 6 – Inflamação: Apêndice perfurado. A: líquido livre ao longo da goteira parietocólica direita (seta). B: Apêndice dilatado (cabeça de seta), com densificação da gordura periapendicular e líquido livre (setas). C: Corte mais inferior demonstrando coleção de pequenas bolhas de gás extraluminais (setas curtas). Adaptado de Del Gaizo AJ, Lall C, Allen BC, Leyendecker JR. From esophagus to rectum: a comprehensive review of alimentary tract perforations at computed tomography. Abdom Imaging. 2014 Aug;39(4):802-23.
FIGURA 6 – Inflamação: Apêndice perfurado. A: líquido livre ao longo da goteira parietocólica direita (seta). B: Apêndice dilatado (cabeça de seta), com densificação da gordura periapendicular e líquido livre (setas). C: Corte mais inferior demonstrando coleção de pequenas bolhas de gás extraluminais (setas curtas). Adaptado de Del Gaizo AJ, Lall C, Allen BC, Leyendecker JR. From esophagus to rectum: a comprehensive review of alimentary tract perforations at computed tomography. Abdom Imaging. 2014 Aug;39(4):802-23.

Um papel importante dos exames de imagem é a localização do ponto de perfuração para auxiliar na escolha da técnica cirúrgica adequada. Agora, vamos aprender algumas dicas para encontrar esse local de acordo onde o gás foi intraperitoneal livre foi observado:

  • Somente no abdome superior, perfuração mais provável na porção inicial do trato gastrointestinal (estômago, duodeno, intestino delgado proximal);
  • Somente na pelve, geralmente decorre de perfuração no cólon e, menos frequentemente, no intestino delgado;
  • Fora do peritônio (retropneumoperitônio), ocorre principalmente por lesão retroperitoneal que pode ocorrer na segunda e terceira porção duodenal, cólon ascendente ou descendente e no terço distal do reto.

Outra dica para identificar melhor o local da perfuração é a presença de qualquer um desses três achados de TC:

  • Espessamento segmentar da parede intestinal;
  • Defeito focal da parede intestinal;
  • Bolhas de gás encontradas próximo à parede intestinal.

Além disso, pode-se encontrar padrões de distribuição de gás de acordo com a patologia que teria levado a perfuração (TABELA 1)

Sítio de perfuraçãoQuantidade de gás livreLocalização
EsôfagoVariávelMediastino posterior
Estômago e bulbo duodenalGrandeAbdome superior/intraperitoneal
Duodeno retroperitonealVariávelRetroperitoneal/espaço pararrenal anterior direito
Intestino delgadoPequenaIntramesentérico/Intraperitoneal
ApêndicePequenaPeriapendicular
CólonVariávelVariável (depende do sítio de perfuração), intra e/ou retroperitoneal

Curtiu saber mais sobre o abdome agudo perfurativo?

É importante ter em mente que a radiografia continua sendo o exame inicial na avaliação do abdome agudo perfurativo e do pneumoperitônio, já que é capaz de identificar pequenas quantidades de gás livre. 

No entanto, o exame de escolha é a tomografia, pela sua capacidade em identificar informações importantes para o planejamento cirúrgico. 

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CynthiaBorborema

Cynthia Borborema

Paraense apaixonada pela radiologia. Formada pela Universidade do Estado do Pará (UEPA). Residência em Radiologia e Diagnóstico por Imagem na Santa Casa de Misericórdia de São Paulo. Adora a culinária paraense, novas tecnologias e a arte de ensinar.