Ascite na cirrose: tudo que você precisa saber

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Fala, pessoal! Hoje vamos falar sobre ascite na cirrose. Primeiramente, é válido ressaltar que a ascite é uma condição clínica na qual o paciente possui um acúmulo de líquidos em cavidade abdominal de forma patológica. A etiologia da palavra vem do grego “askos”, que significa “saco”. A partir disso, surgiram as derivações “askites” e o termo atual de ascite.

O acúmulo de líquido em cavidade abdominal pode acontecer por diversos fatores predisponentes, sendo a correlação com cirrose hepática a mais comum e, também, com o seu consequente extravasamento de plasma sanguíneo. O conteúdo acumulado pode ser de origens variadas, tais como:

  • bile;
  • sangue;
  • suco pancreático;
  • linfa;
  • urina.

Essa condição vai depender dos órgãos e vias comprometidas.

Quer entender um pouco mais sobre ascite e por que ela é mais vista em pacientes cirróticos? Então este artigo é essencial para você!

Ascite na cirrose: entendendo a fisiopatologia

Existem três teorias que foram desenvolvidas para melhor compreender os mecanismos que envolvem e levam a formação da ascite em um paciente cirrótico: vasodilatação, overflow (super-fluxo) e underfill (baixo-enchimento). Cada uma se correlaciona em maior ou menor grau com as fases evolutivas da doença> Por exemplo: a fase de dilatação estaria presente no estágio pré-ascítico, em que, de modo compensatório, ocorreria a vasodilatação periférica e maior retenção de sódio e água.

Em estágio inicial da hepatopatia (1 a 2 meses de evolução), o aumento da volemia pelo consequente crescimento de retenção hídrica proporciona o segundo estágio de “overflow”, o qual predispõe o indivíduo à evolução do escape de líquido para a cavidade peritoneal. Isso favorecerá, também, a formação de maneira gradativa da ascite. Nesse estágio, ainda, está presente a vasodilatação periférica, que piora com o avançar do quadro.

Em um momento mais avançado (por volta de 4 a 6 meses), caracteriza-se o estágio de “underfill”. Como supracitado, ocorre a permanência e piora do quadro de vasodilatação periférica. Em resposta à redução acentuada do volume circulante, ocorre o estímulo constante de vasopressores e de controle hídrico por mecanismo renal. Ademais, como mecanismo final para o acúmulo de líquidos, a saturação da drenagem linfática corporal e, principalmente, da drenagem hepática, contribuem para o extravasamento de líquido.

Por levar o paciente enfermo a um estado de hipertensão portal e consequente insuficiência venosa com acúmulo de sangue, proporciona-se, por diferença de pressão, o extravasamento de plasma sanguíneo.

Antes de falarmos sobre outras situações em que podem surgir casos de ascite, quero aproveitar para te contar que você pode saber mais sobre como lidar com a cirrose e suas complicações, de forma prática, no nosso e-book Cirrose hepática e suas complicações, que traz as principais informações que você precisa saber na hora de diagnosticar e manejar um paciente hepatopata. Clique AQUI para fazer o download gratuito!

Outras situações em que podem surgir casos de ascite

Inúmeras patologias podem desencadear um estado a favor do desenvolvimento de ascite. Apesar de conhecermos a causa mais frequente, é válido, no entanto, identificar quais outras patologias podem ter correlação com essa condição.

A melhor forma de separarmos as etiologias mais frequentes é por meio da divisão entre sistemas e patologias. Por exemplo, em doenças relacionadas à hipertensão portal, temos:

  • a cirrose;
  • a insuficiência hepática;
  • condições que levam ao retardo ou obstrução do fluxo de saída do sangue hepático (Insuficiência Cardíaca Congestiva, Pericardite constritiva, Síndrome de Budd-Chiari e doença veno-oclusiva).

Além disso, temos causas como neoplasias e infecções dos tipos:

  • AIDS e tuberculose peritoneal; 
  • renais (Síndrome Nefrótica ou de caráter nefrogênico em paciente dialíticos);
  • endócrinas;
  • pancreáticas;
  • biliares;
  • dentre outras comuns ao controle da volemia e modificadores da pressão no sistema porta-hepático.

Como diagnosticar a ascite

O primeiro passo na busca por ascite é a correlação minuciosa entre a história clínica e o exame físico. Alguns testes são fundamentais para a suspeita diagnóstica: o teste de piparote, o de macicez móvel dos líquidos e o semicírculos de Skoda são úteis na busca por ascites com volume superior a 1500mL.

O exame fundamental para realização do diagnóstico de ascite é a paracentese diagnóstica, com análise clínica do líquido. É necessário ter cautela e realizar o procedimento com todos cuidados assépticos e paramentação adequada. Dentre as indicações para o procedimento, temos todos os pacientes com:

  • ascite de origem indefinida;
  • condições clinicas suspeitas de infecção;
  • dor abdominal;
  • febre;
  • encefalopatia hepática;
  • piora da função renal.

Na análise do líquido ascítico, deve-se verificar a concentração de albumina pelo gradiente de albumina soro-ascite (GASA). Isso representa a diferença entre albumina sérica e do líquido ascítico e identifica ascites causadas por hipertensão portal com uma acurácia de 97%.

  • GASA = albumina sérica – albumina do líquido ascético 
  • GASA > 1,1g/dl = hipertensão portal
  • GASA < 1,1g/dl = ausência de hipertensão portal

Portanto, conforme o resultado do GASA, podemos separar as etiologias da ascite, como demonstrado na tabela abaixo:

Confira a tabela relacionada ao tema da ascite na cirrose!
Imagem 1. Casos de ascite com gasa aumentado e ascite com gasa diminuído.

Algumas das contraindicações para o procedimento são:

  • pacientes não cooperativos;
  • com infecção de parede abdominal;
  • gestantes;
  • coagulopatas graves ou com distensão grave de alças intestinais.

Como manejar a ascite na cirrose

O manejo do paciente vai depender da etiologia, mas, para todos os casos, é recomendada a interrupção completa de consumo de álcool e realização de uma dieta hipossódica, com uma ingesta menor 2g/dia. No que diz respeito à ingesta de água, não existe restrição, a menos que os valores de sódio sérico estejam menores que 120 mEq/L (hiponatremia significativa).

A conduta medicamentosa se baseia no uso de diuréticos poupadores de potássio em monoterapia até 400mg ou associado a diuréticos de alça. Caso seja necessário, é preciso realizar a internação hospitalar para melhor controle e seguimento do sódio sérico do paciente, o que facilita o manejo incial. Tem por objetivo a redução de 500mL a 1000mL por dia, que pode ser monitorizada pela perda ponderal do paciente.

Uma breve conclusão sobre a ascite

Entende-se, portanto, que a ascite é uma condição que evolui para perda de controle da volemia e de aumento de pressão no sistema porta. Os pacientes perdem líquido para o terceiro espaço e, consequentemente, evoluem para formas mais complicadas dessa patologia.

Desse modo, é válido recordar os três fatores fundamentais na fisiopatologia dessa condição: vasodilatação, overflow e underfil. É bom salientar que cada uma terá uma correlação com a evolução da patologia e, em pacientes avançados, o predomínio será de vasodilatação periférica extensa e mecanismos compensatórios, como o estímulo constante vasopressor e ode controle renal da volemia, pelo estado de underfil apresentado pelo paciente.

Sobre os exames complementares, temos a paracentese como o de maior acurácia. É utilizada, também, a ultrassonografia como ferramenta de auxílio diagnóstico, para detectar ascites de pequenos volumes, maiores que 100mL. Ademais, além dos exames supracitados, temos uma diversidade de exames a serem explorados, tais como: cultura, glicose, DHL e triglicérides. Esses fatores, por sua vez, podem contribuir para uma hipótese diagnóstica mais assertiva.

Sobre a ascite na cirrose, é isso!

Ficou com alguma dúvida acerca da ascite na cirrose? Deixe um comentário aqui embaixo! Será um prazer respondê-lo!

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Colaborou para a produção deste artigo: Mateus Misson

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AnuarSaleh

Anuar Saleh

Nascido em 1993, em Maringá, se formou em Medicina pela UEM (Universidade Estadual de Maringá). Residência em Medicina de Emergência pelo Hospital Israelita Albert Einstein.