O processo de tomada de decisões médicas é um fator muito importante no dia a dia de qualquer profissional. Afinal, é isso o que reforça a responsabilidade que existe sobre cada paciente. O que algumas pessoas talvez não saibam é que os vieses cognitivos podem influenciar bastante nessas escolhas.
Por isso, é recomendável entender mais sobre eles! Tanto para saber lidar com eles da maneira certa, quanto para evitar possíveis erros. Porque, ainda que esses vieses façam parte da natureza humana, a Medicina não abre espaço para dúvidas e incerteza, não é mesmo?
Então, vamos lá! A seguir, a gente te explica um pouco mais sobre o assunto, com algumas dicas valiosas para aplicar em situações mais complexas. Confira!
Os vieses cognitivos são distorções sistemáticas no raciocínio clínico que podem influenciar o julgamento e as decisões dos profissionais de saúde. Eles ocorrem quando a mente humana utiliza atalhos mentais, conhecidos como heurísticas, para tomar decisões rápidas, o que pode resultar em erros de diagnóstico, tratamento ou prognóstico.
Esses vieses surgem em situações de incerteza, pressão de tempo ou complexidade de casos clínicos, impactando a precisão e a eficácia do atendimento médico.
Sendo assim, podem fazer com que um médico interprete incorretamente sintomas, priorize informações erradas ou negligencie evidências relevantes.
Mas, e então, quais são os tipos de vieses cognitivos? Veja um pouco mais sobre as classificações daqueles que se manifestam com maior frequência na atividade médica.
O viés de ancoragem ocorre quando um médico se fixa em uma informação inicial, como o primeiro sintoma ou diagnóstico presumido, e não ajusta sua avaliação mesmo quando novas informações são disponibilizadas.
Por exemplo, ao ver um paciente com dor no peito, um médico pode ancorar no diagnóstico de infarto e negligenciar outras possíveis causas, como embolia pulmonar.
Viés de Confirmação
Esse viés leva o médico a buscar ou interpretar informações que confirmem suas hipóteses iniciais, ignorando dados que possam sugerir outra condição.
Um exemplo é quando, diante de um paciente com febre e tosse, o médico foca em sinais que confirmem uma infecção respiratória e desconsidera outros fatores que indiquem uma condição mais séria, como sepse.
O viés de representatividade ocorre quando o médico compara o caso atual com um caso típico ou comum, subestimando a possibilidade de diagnósticos menos óbvios.
Isso pode levar a erros, especialmente em pacientes com apresentações atípicas de doenças comuns ou com condições raras que não correspondem ao “perfil clássico” esperado.
Esse viés acontece quando o médico baseia sua decisão nas informações que estão mais facilmente disponíveis em sua memória.
Por exemplo, se um médico recentemente diagnosticou vários casos de pneumonia, ele pode estar mais inclinado a diagnosticar pneumonia em um novo paciente com sintomas semelhantes, mesmo que outras doenças possam ser responsáveis por eles.
No viés de atribuição, o médico tende a atribuir o comportamento ou sintomas do paciente a fatores internos, como personalidade ou estilo de vida, em vez de investigar causas biológicas ou externas.
Um exemplo comum é atribuir sintomas de fadiga em um paciente obeso a seu estilo de vida, sem considerar condições médicas subjacentes, como uma disfunção tireoidiana.
O viés de afetividade se manifesta quando as emoções ou preferências pessoais do médico influenciam seu julgamento clínico.
Por exemplo, um médico que simpatiza mais com um paciente pode subestimar a gravidade de uma condição, enquanto, em outro paciente com quem ele não tem afinidade, pode ser mais rigoroso em suas avaliações e condutas.
O viés de fundamento, por sua vez, surge quando um médico confia excessivamente em informações preconcebidas ou suposições, como acreditar que um determinado grupo de pacientes é mais ou menos propenso a uma certa doença.
Como exemplo, subestimar a possibilidade de infarto em uma mulher jovem, porque a doença cardíaca é mais prevalente em homens mais velhos.
Sem dúvidas, os vieses cognitivos têm um impacto profundo na qualidade do atendimento médico, afetando tanto a precisão dos diagnósticos quanto a eficácia dos tratamentos.
Quando não identificados e corrigidos, comprometem a tomada de decisões clínicas, levando a resultados adversos para os pacientes. As consequências disso podem ser as seguintes!
Médicos que são influenciados por vieses como o de ancoragem ou de confirmação podem se fixar em um diagnóstico inicial e não considerar outras possibilidades. O que pode resultar no atraso ou na falha de diagnóstico de condições sérias.
Quando o prognóstico é baseado em percepções equivocadas ou em uma avaliação distorcida das informações disponíveis, o médico pode subestimar ou superestimar a gravidade da condição de um paciente.
Um prognóstico incorreto pode afetar o planejamento do tratamento, o acompanhamento e as orientações dadas ao paciente, comprometendo o desfecho clínico.
Um médico influenciado pelo viés de disponibilidade pode prescrever um medicamento que teve bons resultados em pacientes recentes. Tudo sem considerar as necessidades específicas ou contraindicações do paciente atual.
Da mesma forma, o viés de afetividade pode levar um médico a prescrever um tratamento mais agressivo ou menos rigoroso, dependendo da relação emocional que ele tem com o paciente. Dessa maneira, as decisões resultam em efeitos colaterais indesejados, falta de eficácia do tratamento ou até complicações graves.
E então, como e o que fazer para minimizar o impacto dos vieses cognitivos na atuação médica? Aqui, temos algumas dicas muito importantes para serem colocadas em prática!
Desenvolver autoconhecimento é uma das primeiras etapas para reduzir os vieses. Ao identificar seus próprios padrões de pensamento e reconhecer como suas crenças, experiências e emoções podem influenciar o julgamento, o médico se torna mais consciente de possíveis desvios.
Consultar colegas ou especialistas em situações clínicas complexas é uma maneira eficaz de combater os vieses. Se buscar outras opiniões, o médico abre espaço para novas perspectivas e reduz a chance de se fixar em uma única interpretação dos fatos. Além disso, a colaboração interdisciplinar e a discussão de casos com outros profissionais aumentam a qualidade do diagnóstico e do tratamento.
Adotar a medicina baseada em evidências (MBE) é uma ferramenta poderosa para neutralizar vieses. A MBE se fundamenta na melhor evidência científica disponível, orientando as decisões clínicas com base em estudos rigorosos, em vez de se basear apenas na experiência ou intuição. Portanto, seguir diretrizes clínicas e protocolos baseados em evidências ajuda a reduzir a influência de vieses pessoais.
Incentivar o pensamento analítico, que envolve uma abordagem mais lenta e deliberada, previne decisões rápidas e intuitivas baseadas em heurísticas. Analisar cada caso de maneira detalhada, considerando todas as possibilidades diagnósticas e reavaliando constantemente a evolução do paciente, contribui para uma prática médica mais precisa e cuidadosa.
Práticas que melhoram a cognição, como a resolução de problemas complexos, exercícios de memória e a prática de mindfulness, costumam ajudar os médicos a tomar decisões mais claras e menos influenciadas por atalhos cognitivos. Essas práticas treinam a mente a ser mais flexível e analítica, reduzindo a propensão a vieses inconscientes.
A aprendizagem baseada em problemas (ABP) é uma metodologia educacional que incentiva o raciocínio crítico e a análise profunda de situações complexas. Ao usar cenários clínicos reais para treinar o pensamento médico, a ABP estimula a habilidade de identificar e corrigir vieses, promovendo um processo de tomada de decisão mais informado e cuidadoso.
Já o treinamento metacognitivo envolve o desenvolvimento da capacidade de monitorar e regular os próprios processos de pensamento. Ao refletir sobre como as decisões são tomadas e quais fatores influenciam o raciocínio, o médico identifica vieses e ajusta suas estratégias. Esse processo inclui questionar suposições iniciais e rever continuamente o curso do diagnóstico e tratamento.
A melhoria da percepção clínica envolve a capacidade de observar e interpretar dados objetivos de maneira mais acurada, evitando a influência de vieses. Isso pode ser feito por meio de treinamentos que reforçam a atenção aos detalhes e o uso correto de exames e ferramentas diagnósticas. Com uma percepção mais aguçada, o médico evita a supervalorização de sinais ou sintomas que reforcem um viés.
Por fim, receber e dar feedback é uma prática importante para a redução de vieses. Avaliar casos com colegas e discutir o que poderia ter sido feito de forma diferente proporciona uma visão mais clara sobre as decisões tomadas. Aprender com os erros, tanto próprios quanto dos outros, e implementar mudanças nas abordagens clínicas são essenciais para uma prática médica mais segura e eficaz.
É isso aí! Você já tem uma base mais aprofundada sobre o que são vieses cognitivos e como eles influenciam a tomada de decisões médicas. A partir dessas informações, pode começar a administrar melhor essas manifestações, e assim, melhorar cada vez mais o atendimento prestado a seus pacientes.
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Nascido em 1991, em Florianópolis, formado pela Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC) em 2015 e com Residência em Clínica Médica pelo Hospital das Clínicas da FMUSP (HC-FMUSP) e Residência em Administração em Saúde no Hospital Israelita Albert Einstein (HIAE). Fanático por novos aprendizados, empreendedorismo e administração. Siga no Instagram: @alexandre.remor