O que os médicos precisam saber sobre o Estatuto da Criança e do Adolescente?

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Sabia que o Estatuto da Criança e do Adolescente é muito importante para os médicos? É isso mesmo! Para prestar um atendimento adequado a esse público, é preciso ir muito além da prática cirúrgica e clínica. É indispensável, também, entender quais são os direitos que ele tem.

Inclusive, ter domínio sobre o assunto é uma maneira de evitar problemas legais. Afinal, você saberá exatamente o que preservar ao longo da conversa, dos exames e das orientações que são repassadas, e até mesmo quando e como fazer algum encaminhamento jurídico caso necessário.

Então, vamos lá? A seguir, a gente te conta tudo o que você precisa entender a respeito do Estatuto e por que ele é tão importante. Boa leitura!

O que é o Estatuto da Criança e do Adolescente?

O Estatuto da Criança e do Adolescente, estabelecido pela Lei nº 8.069/1990, é uma legislação que define os direitos e garantias das crianças e adolescentes no Brasil. Ele reconhece as crianças como titulares de direitos e prevê diversas medidas de proteção, assistência, promoção e garantia desses direitos em várias áreas, incluindo a saúde.

O direito à saúde é um dos direitos fundamentais assegurados pelo ECA. Conforme o artigo 7º do Estatuto, é responsabilidade da família, da comunidade, da sociedade em geral e do Estado garantir à criança e ao adolescente, com prioridade absoluta, o direito à vida, saúde, alimentação, educação, entre outros.

Além disso, o documento estabelece diretrizes e ações focadas na promoção da saúde infantil. Por exemplo, o artigo 14º determina que é dever do Estado assegurar às crianças e adolescentes acesso universal e igualitário à saúde, por meio da implementação de políticas sociais e econômicas que visem à redução do risco de doenças e de outros agravos, além de proporcionar acesso universal e igualitário às ações e serviços de promoção, proteção e recuperação da saúde.

O que a Constituição assegura para esses pacientes?

Entre as atribuições que visam promoção da saúde infantil por meio do ECA, estão:

  • prioridade absoluta: o Estatuto estabelece que crianças e adolescentes têm prioridade absoluta em todas as políticas públicas e sociais, incluindo a saúde. O que significa que todas as ações relacionadas à saúde devem garantir o bem-estar e a qualidade de vida desses indivíduos;
  • acesso universal à saúde: o ECA assegura o acesso universal e igualitário à saúde, sem discriminação. Isso implica que todas as crianças têm direito a atendimento médico, vacinação, cuidados preventivos e tratamentos adequados para garantir sua saúde física e mental.
  • participação e informação: por fim, o documento incentiva a participação ativa das crianças e adolescentes nas decisões relacionadas à sua saúde. Além disso, promove o direito à informação, garantindo que eles sejam devidamente informados sobre cuidados de saúde, prevenção de doenças e outros aspectos relevantes para sua saúde e bem-estar.

Direitos da Criança e do Adolescente hospitalizados

Além disso, é de suma importância reconhecer os direitos específicos de crianças e adolescentes hospitalizados. De acordo com o Estatuto, são eles:

  1. Direito à proteção à vida e à saúde, com absoluta prioridade e sem qualquer forma de discriminação.
  2. Direito a ser hospitalizado quando for necessário ao seu tratamento, sem distinção de classe social, condição econômica, raça ou crença religiosa.
  3. Direito a não ser ou permanecer hospitalizado desnecessariamente por qualquer razão alheia ao melhor tratamento de sua enfermidade.
  4. Direito a ser acompanhado por sua mãe, pai ou responsável, durante todo o período de sua hospitalização, bem como receber visitas.
  5. Direito a não ser separado de sua mãe ao nascer.
  6. Direito a receber aleitamento materno sem restrições.
  7. Direito a não sentir dor, quando existem meios para evitá-la.
  8. Direito a ter conhecimento adequado de sua enfermidade, dos cuidados terapêuticos e diagnósticos a serem utilizados, do prognóstico, respeitando sua fase cognitiva, além de receber amparo psicológico, quando se fizer necessário.
  9. Direito a desfrutar de alguma forma de recreação, programas de educação para a saúde, acompanhamento do currículo escolar, durante sua permanência hospitalar.
  10. Direito a que seus pais ou responsáveis participem ativamente do seu prognóstico, tratamento e prognóstico, recebendo informações sobre os procedimentos a que será submetido.
  11. Direito a receber apoio espiritual e religioso conforme prática de sua família.
  12. Direito a não ser objeto de ensaio clínico, provas diagnósticas e terapêuticas, sem o consentimento informado de seus pais ou responsáveis e o seu próprio, quando tiver discernimento para tal.
  13. Direito a receber todos os recursos terapêuticos disponíveis para a sua cura, reabilitação e ou prevenção secundária e terciária.
  14. Direito a proteção contra qualquer forma de discriminação, negligência ou maus tratos.
  15. Direito ao respeito a sua integridade física, psíquica e moral.
  16. Direito à preservação de sua imagem, identidade, autonomia de valores, dos espaços e objetos pessoais.
  17. Direito a não ser utilizado pelos meios de comunicação, sem a expressa vontade de seus pais ou responsáveis, ou a sua própria vontade, resguardando-se a ética.
  18. Direito à confidencialidade dos seus dados clínicos, bem como direito a tomar conhecimento dos dados arquivados na instituição, pelo prazo estipulado em lei.
  19. Direito a ter seus direitos constitucionais e os contidos no Estatuto da Criança e do Adolescente respeitados pelos hospitais integralmente.
  20. Direito a ter uma morte digna, junto a seus familiares, quando esgotados todos os recursos terapêuticos disponíveis

Por que um médico deve conhecer o Estatuto da Criança e do Adolescente?

Um médico deve conhecer o Estatuto da Criança e do Adolescente para garantir que direitos sejam respeitados e atendidos. Além disso, compreender as obrigações legais e éticas relacionadas ao atendimento de crianças e adolescentes permite que os médicos pratiquem sua profissão de maneira informada e responsável, assegurando que suas ações estejam alinhadas com a legislação vigente.

O ECA ainda estabelece deveres específicos para profissionais de saúde, como a obrigatoriedade de notificar casos de maus-tratos. Assim, médicos informados sobre essas exigências podem cumprir suas responsabilidades legais e evitar consequências jurídicas.

Conhecer o ECA permite igualmente que os médicos identifiquem e intervenham adequadamente em situações de risco, promovendo a proteção e segurança das crianças e adolescentes sob seus cuidados. O Estatuto não só foca no tratamento de doenças, mas também na promoção da saúde integral, incluindo aspectos preventivos e educacionais.

Compreender os direitos e necessidades específicas das crianças e adolescentes ajuda os médicos a desenvolverem um atendimento mais empático, respeitoso e centrado no paciente, fortalecendo a relação médico-paciente

Por fim, o Estatuto ajuda os profissionais a atuarem como defensores dos direitos das crianças e adolescentes, influenciando políticas de saúde e contribuindo para melhorias no sistema.

Como proceder no atendimento a adolescentes?

Mas, e na prática, como proceder no atendimento a adolescentes dentro e fora da Pediatria? Confira as principais indicações para esse momento e o que fazer para assegurar o cumprimento dos direitos do ECA.

Acolhimento ético

Durante a consulta com adolescentes, é fundamental realizar um acolhimento ético, que envolva receber o paciente com respeito, empatia e sensibilidade. O profissional deve garantir um ambiente seguro e acolhedor, onde o adolescente se sinta à vontade para compartilhar suas preocupações e histórias. Demonstrar interesse genuíno e escuta ativa é essencial para construir uma relação de confiança.

Sigilo

O sigilo é um componente crucial nas consultas com adolescentes. É importante esclarecer ao paciente que todas as informações compartilhadas serão mantidas em confidencialidade, salvo situações em que a segurança do próprio adolescente ou de terceiros esteja em risco. Este compromisso com a privacidade encoraja a honestidade e abertura durante a consulta, essencial para um diagnóstico e tratamento eficazes.

Anamnese

A anamnese é uma etapa vital na consulta, onde o médico coleta informações detalhadas sobre a história médica, social e psicológica do adolescente. Perguntas sobre hábitos de vida, ambiente familiar, atividades escolares e relacionamentos interpessoais ajudam a formar um quadro completo da saúde do adolescente. Essa etapa precisa ter dois momentos: um a sós com o paciente, para que ele se sinta livre para expressar suas queixas, e um na presença dos pais.

Abordagem HEEADSSS

A abordagem HEEADSSS é uma ferramenta estruturada para a anamnese de adolescentes que deve ser aplicada na consulta, para ajudar a cobrir todos os pontos importantes de análise. A sigla representa o seguinte:

  • Home (Casa): condições e relações familiares.
  • Education/Employment (Educação/Trabalho): desempenho escolar, ambiente de trabalho e aspirações futuras.
  • Eating (Alimentação): hábitos alimentares e preocupações com peso.
  • Activities (Atividades): lazer, esportes e atividades extracurriculares.
  • Drugs (Drogas): uso de substâncias lícitas e ilícitas.
  • Sexuality (Sexualidade): orientação sexual, práticas sexuais e saúde reprodutiva.
  • Suicide/Depression (Suicídio/Depressão): estado emocional, presença de sintomas depressivos e pensamentos suicidas.
  • Safety (Segurança): exposição a situações de risco, como violência ou bullying.

Exame físico

O exame físico deve ser conduzido com respeito e consideração, garantindo a privacidade do adolescente. É indispensável explicar cada etapa do exame, e solicitar o consentimento antes de prosseguir é imperativo, a fim de manter o conforto e a dignidade do paciente. O exame deve ser abrangente, incluindo avaliação de crescimento, desenvolvimento puberal e sinais de possíveis problemas de saúde.

Principais queixas no setor ambulatorial

No setor ambulatorial, as principais queixas dos adolescentes podem incluir problemas dermatológicos como acne, distúrbios alimentares, questões relacionadas à saúde mental como ansiedade e depressão, dores de crescimento, problemas menstruais nas meninas, questões de saúde sexual e reprodutiva e uso de substâncias. Também são comuns queixas sobre dores de cabeça, dores abdominais e sintomas respiratórios.

Agora você conhece mais sobre o Estatuto da Criança e do Adolescente!

É isso aí! O Estatuto da Criança e do Adolescente é assunto sério e que merece sua atenção e aprofundamento. Mas agora você já está por dentro do que é mais importante e pode começar a aplicar em seu dia a dia de atendimentos.Quer se preparar ainda mais para ter uma boa atuação? Inscreva-se no PSMedway e adquira mais segurança nos seus plantões!

AlexandreRemor

Alexandre Remor

Nascido em 1991, em Florianópolis, formado pela Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC) em 2015 e com Residência em Clínica Médica pelo Hospital das Clínicas da FMUSP (HC-FMUSP) e Residência em Administração em Saúde no Hospital Israelita Albert Einstein (HIAE). Fanático por novos aprendizados, empreendedorismo e administração. Siga no Instagram: @alexandre.remor