Otite Média Aguda: a maior infecção de vias aéreas superiores

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Fala, galera! Hoje vamos abordar mais um tema bastante recorrente do Pronto Socorro Pediátrico, a Otite Média Aguda (OMA). Antes de falar dessa grande perturbadora dos nossos pequenos, vamos dar um passo pra trás e nos lembrar das famosas “IVAS”, as Infecções de Vias Aéreas Superiores!

Você sabia que uma criança pode ter em média 8 a 10 IVAS por ano? Principalmente as crianças que frequentam creches e escolinhas, pois se expõem a um maior contato social com outras crianças e um monte de vírus acaba circulando. Além disso, não podemos nos esquecer do menor calibre das vias aéreas dos nossos pequenos, que, junto da reação inflamatória, pode levar a um desconforto respiratório importante.

O que é otite média aguda?

A Otite Média Aguda acontece pela rápida instalação de sinais e sintomas inflamatórios na orelha média. Vocês se lembram da anatomia da orelha? Bom, pra quem não lembra vou colocar aqui uma figura que vai nos ajudar:

Na imagem: anatomia da orelha, onde ocorre a otite média aguda

Falamos sobre a ideia de pensar em IVAS quando a criança chega com a mãe na sua frente contando que “não aguenta mais o filho ficar resfriado desde que começou a ir para creche ou escola”, mas nossa criança pode estar ainda mais catarrenta e ter mais predisposição a Otite Média Aguda se tiver alguém em casa que fuma, se teve desmame precoce, for menor de 2 anos de idade, tiver alterações anatômicas ou uso de chupeta

Além disso, checou a carteira de vacinas? Estudos recentes defendem que vacinas como a conjugada antipneumocócica e a contra influenza podem ser recomendadas como prevenção de OMA.

Mas como uma simples infecção de vias aéreas superiores pode levar a um quadro de otite média aguda?

A nasofaringe da criança começa a produzir uma quantidade maior de muco por conta de uma infecção viral associado a algum grau de disfunção da tuba auditiva, esse muco purulento se acumula na orelha média, aumenta a pressão e leva ao abaulamento da Membrana Timpânica

Existe um outro tipo de Otite, chamada Otite Média Serosa ou com Efusão, esse tipo de otite apresenta muco purulento, mas sem sinais de inflamação, se diferenciando da Otite Média Aguda propriamente dita. 

Imagem ilustrativa de Otite Média Serosa ou com Efusão
Imagem ilustrativa de Otite Média Serosa ou com Efusão

A infecção pode ter começado como uma infecção viral que se complica como bacteriana, que é o que ocorre na maioria das vezes. Ou ela pode ser diretamente uma infecção bacteriana em si, e aqui surgem os 3 mosqueteiros da OMA:

  • Streptococcus pneumoniae
  • Haemophilus influenzae
  • Moraxella catarrhalis

Lembrem-se deles, pois serão muito cobrados nas provas de vocês!

A criança chega ao Pronto Atendimento se queixando de dor de ouvido, pode vir chorosa, se alimentando mal, pode ter vômito/diarreia e nem sempre vem com febre.

Agora vem a parte mais importante do Exame Clínico: OTOSCOPIA!

Na otoscopia, a membrana timpânica pode estar opaca, abaulada, hiperemiada, pode ter nível líquido na orelha média e saída de secreção.

A: Normal; B: Abaulamento de membrana timpânica; C: Abaulamento moderado de membrana timpânica; D: Abaulamento grave de membrana timpânica

Quem avisa amigo é… atenção ao fazer otoscopia de criança com febre ou chorando, pois a membrana timpânica pode ser estar mais vermelha (hiperemiada) mesmo.

Cuidado, o diagnóstico é clínico!

Para bater o martelo e guiar sua conduta, o diagnóstico de OMA precisa ter um dos seguintes critérios:

  • Abaulamento moderado ou grave de membrana timpânica
  • Abaulamento leve de membrana timpânica E <48h de otalgia OU hiperemia importante de membrana timpânica
  • Otorreia (cuidado para não confundir com otite externa, hein!?)

Se nem tudo que reluz é ouro, nem toda OMA deverá ganhar antibiótico! Lembre-se bem disso!

Para você não errar, coloquei aqui quem deve receber antibiótico SEMPRE:

  • Menores de 6 meses
  • Imunodeficientes
  • Sinais de gravidade

– otalgia ≥48h

– febre maior ou igual a 39°C

Vou deixar um quadro aqui que vocês vão colar na mente, tirar print e deixar no fundo de tela do celular para não esquecerem mais das recomendações atuais da Academia Americana de Pediatria para tratamento da Otite Média Aguda:

Recomendações para Abordagem Inicial da Otite Média Aguda não Complicada

IdadeOtorreia com OMA confirmadaOMA unilateral ou bilateral com sinais de gravidadeOMA bilateral sem otorreiaOMA unilateral sem otorreia
6 meses – 2 anosATBATBATBATB ou OBS
≥2 anosATBATBATB ou OBSATB ou OBS
De Lieberthal AS, Carroll AE, Chonmaitree T, ET AL. The diagnosis and management of acute otitis media. Pediatrics 131: e964-e999, 2013, Tabela 4

ATB: Terapia antimicrobiana

OBS: Observação adicional

O grande guerreiro dessa batalha é AMOXICILINA na dose de 50 a 90mg/kg/dia, preferencialmente dada 2x/dia, caso apresente alergia a penicilinas, a alternativa seria cefuroxima ou ceftriaxone. E caso não responda ao uso de amoxicilina, as opções que temos são: aumentar a dose para 90mg/kg/dia por 10 dias e/ou associar ao clavulanato (buscando cobrir as cepas produtoras de betalactamase, que seriam os mecanismos de resistência principalmente do H.influenzae e da M.catarrhalis).

As últimas diretrizes propõem um período de “espera vigilante”, ou seja, a possibilidade de se acompanhar cuidadosamente alguns pacientes ao invés de se prescrever logo de cara o antibiótico. Essa observação adicional inclui avaliar ausência de resolução espontânea ou piora dos sintomas, além da prescrição de analgesia adequada. Se essa criança retornou após 48 horas pior, aí não vai ter jeito, vai ganhar um antibiótico para casa. Mas lembre-se, você precisa garantir que vai poder reavaliar essa criança depois de 48 horas da avaliação inicial, ok?

E se você quer dominar a base da analgesia e sedação pra se sentir seguro para prescrever um plano de analgesia otimizado e individualizado, sugiro fazer o nosso Curso de Analgesia e Sedação: do PS à UTI, que é gratuito e oferece certificado de conclusão! Nele, vamos te dar a base que você precisa para entender como e por que prescrever determinadas drogas, tudo por meio de aulas com uma abordagem direta, simples e sem enrolação, com apostilas, questões de revisão e muito mais.

Agora que vocês já sabem diagnosticar e tratar Otite Média Aguda, como fica o seguimento dessa criança?

Nesse momento saímos um pouco do Pronto Atendimento e vamos entrar na Pediatria Ambulatorial. Chamamos de Otite Média Recorrente, aqueles casos que se apresentam com 3 ou mais OMAs em 6 meses ou com 4 ou mais episódios em um ano, sendo pelo menos um deles nos últimos 6 meses. 

Nesses casos a orientação é NÃO oferecer antibioticoterapia profilática de rotina, alguns casos podem ser conduzidos com timpanostomia, com avaliação do Otorrinolaringologista. A timpanostomia nada mais é que a colocação do tubinho para ventilação.

Por fim, não comam bola e se liguem nas complicações possíveis da Otite Média Aguda: mastoidite, trombose de seio venoso (raro mas acontece), paralisia do nervo facial e baixa acuidade auditiva.

Quer ir além do conhecimento sobre Otite Média Aguda?

Se você deseja entender mais sobre como proceder em diferentes casos dentro da Medicina de Emergência, como a colangite e a pancreatite crônica, veja o nosso Blog, esses são apenas alguns dos assuntos já tratados por lá! Para complementar, você pode dar uma olhada no nosso Guia de Prescrições! Com esse nosso e-book 100% gratuito, você vai estar muito mais preparado para atuar em qualquer sala de emergência do Brasil!

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AlyneKorukian Freiberg

Alyne Korukian Freiberg

Médica formada pela Universidade de São Paulo (USP), experiência como fellowship no Centre Hospitalier Universitaire de Lyon (França), atuou como médica das Forças Armadas no Hospital de Força Aérea de São Paulo. Residência em Pediatria do Hospital Israelita Albert Einstein.