A chance de você já ter visto uma persistência do canal arterial e não ter esquecido mais é muito alta. Essa é uma cardiopatia congênita acianótica mais comum em pacientes prematuros e que de vez em quando aparece na nossa unidade de terapia intensiva neonatal.
Vamos conversar aqui um pouco sobre a suspeita, o diagnóstico e também o tratamento da persistência do canal arterial ou, para os íntimos, a PCA. Bora?
Antes de tudo, vamos relembrar uma coisa: o canal arterial é uma estrutura fisiológica e possui papel fundamental na circulação fetal. Ele é uma da tríade de estruturas fundamentais que fazem parte da circulação fetal.
O canal arterial, ou ducto arterioso, está frequentemente localizado imediatamente distal à artéria subclávia esquerda, conectando a aorta á artéria pulmonar esquerda.
Na circulação fetal, sua função é desviar o sangue das artérias pulmonares para a aorta, uma vez que o leito vascular pulmonar intra-útero apresenta alta resistência. Nessa época, apenas 5 a 10% do débito cardíaco passam pela circulação pulmonar. Isso garante que o fluxo sanguíneo com alto teor de oxigênio, proveniente da placenta, alcance a circulação sistêmica.
Aqui é que está o pulo do gato: após o nascimento, com as primeiras ventilações pulmonares, ocorre uma redução importante da resistência vascular pulmonar, o que diminui o fluxo sanguíneo através do canal arterial.
Consequentemente, com a redução da oxigenação naquela região e de mediadores, como as prostaglandinas, há o início da constrição e o fechamento do canal arterial já nas primeiras horas de vida, fechando-se completamente por volta do terceiro ou quarto dia de vida (podendo persistir até o 14º – 21º dia de vida).
Quando esse ducto não se fecha espontaneamente após o nascimento, chamamos de persistência do canal arterial (PCA). O shunt, que na vida intra-útero era direita-esquerda, se inverte após o nascimento, com a queda da pressão no leito pulmonar, que passa a ser menor que a pressão sistêmica.
A sintomatologia e a repercussão hemodinâmica dependem do tamanho do canal arterial e da resistência vascular pulmonar. O achado clássico é o sopro sistodiastólico (em maquinaria) no 2º espaço intercostal esquerdo, em região infraclavicular. As provas AMAM cobrar isso aqui!
Além disso, podemos ter sinais e sintomas semelhantes em comparação a insuficiência aórtica, como se parte do sangue ejetado para a circulação sistêmica fosse “roubado” pela PCA, gerando pulsos amplos e uma pressão de pulso aumentada.
Já nos prematuros, diferente dos recém-nascidos a termo, como a resistência vascular pulmonar é muito baixa, o shunt da aorta para a artéria pulmonar é mais acentuado, provocando um quadro clínico muito importante.
Nestes pacientes, há um risco aumentado de hemorragia cerebral, enterocolite necrotizante e displasia broncopulmonar. Inclusive, a prematuridade é fator de risco para a PCA.
Diferente das outras cardiopatias congênitas, temos uma possibilidade interessante de terapia medicamentosa. A primeira opção terapêutica nos prematuros que necessitam de tratamento é através de inibidores da prostaglandina:
Em pacientes mais velhos, acabamos procedendo a procedimentos minimamente invasivos (preferencial) ou até mesmo cirurgia. A terapia medicamentosa para ocluir o canal arterial não costuma ser eficiente nos nascidos a termo também.
É isso que tínhamos para falar sobre a persistência do canal arterial! Não é nada incomum ver esse tipo de caso no pronto socorro, então sempre fique atento sobre o seu caso clínico!
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Carioca da gema, nasceu em 93 e formou-se Pediatra pela UFRJ em 2019. No mesmo ano, prestou novo concurso de Residência Médica e foi aprovada em Neurologia no HCFMUSP, porém, não ingressou. Acredita firmemente que a vida não tem só um caminho certo e, por isso, desde então trabalha com suas duas grandes paixões: o ensino e a medicina. Siga no Instagram: @jodamedway