Derrame pleural bilateral: a “água no pulmão” de origem incerta

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Fala, pessoal! Hoje, trataremos de um assunto que pode dar aquele frio na espinha de muitos. Trata-se do reconhecimento e tratamento inicial do derrame pleural bilateral. Então, papel e caneta na mão e vem tranquilo.

O que queremos dizer por “água no pulmão”?

Bom, em algum dos seus plantões, você já deve ter ouvido a seguinte frase: “Dr., me ajuda, meu pai está com ‘água no pulmão’ e não tá conseguindo respirar direito. Ele sempre tem isso nessa época do ano…”. 

Confira a imagem 1 relacionada ao derrame pleural bilateral!
Entenda mais sobre o termo “água no pulmão”.

Traduzindo essa fala para o mediquês, sabe-se que “água no pulmão” é o derrame pleural. Este é resultado do acúmulo anormal de fluidos entre a pleura visceral e a pleura parietal – no espaço pleural – decorrente da quebra do equilíbrio entre a produção e absorção de líquidos. 

Mas então, qual seria o quadro clínico apresentado que me levaria a suspeitar de derrame pleural? 

Galera, lembrem o seguinte: o derrame pleural é, em sua maioria das vezes, a complicação de uma doença. Portanto, o paciente pode apresentar-se com sinais de gravidade.

Diante disso, na emergência, não podemos nos esquecer da avaliação inicial do paciente potencialmente grave/grave. Devemos avaliar se há alteração do nível de consciência, presença de sinais de choque circulatório, sinais de obstrução de via aérea e/ou insuficiência respiratória.

Confira a imagem 2 relacionada ao derrame pleural bilateral!
Continue acompanhando nosso artigo a respeito do derrame pleural, a famosa “água no pulmão”.

Mesmo com meu paciente devidamente avaliado, não consegui descobrir a causa do problema. E agora?

Então, pensem comigo, pacientes com derrame pleural podem apresentar-se assintomáticos, ou também com a tríade de sintomas mais comuns são: dispneia, tosse seca e dor torácica.

Durante seu exame físico, provavelmente na ausculta, observou estertoração bilateral e difusa associada com uma percussão submaciça nos hemitórax. Você sabe que ali tem líquido, agora só precisa saber por que ele está lá para poder tratá- lo adequadamente. 

Nessa parte da avaliação, o mais importante será colher dados sobre tempo de evolução do quadro atual, os quais poderão ajudar a elencar hipóteses diagnósticas e dividi-las em mais ou menos prováveis. 

Imaginem só: 

  • Criança, 10 anos, com história de febre, tosse há 5 dias com piora recente da dispneia → derrame parapneumônico.
  • J. P. L, 65 anos, IAM há 5 anos com revasc, HAS, DM, relata que há 10 dias não usa seus medicamentos habituais por achar ter sido “curado”. Relata que a falta de ar piorou muito hoje e está “todo inchado” → ICC.
  • B.J.K, 55 anos, Fumante 45 anos – maço , previamente hígido(“sic”) , relata cansaço há 5 meses, associado a perda de apetite e emagrecimento de 10kg no período (não intencional). Hoje procura esse DE por falta de ar e “escarrar sangue” → malignidade.
  • J.B , 65 anos, institucionalizado, é trazido pela cuidadora da casa de repouso por notar que o paciente anda perdendo peso, fica muito quente e suado a noite e está tossindo muito há 1 mês → tuberculose.

Com essa complementação , conseguimos já ter uma ideia, ou até já firmar o diagnóstico mais provável para o meu paciente. Ainda assim, complementaremos nossa avaliação solicitando alguns exames.

Solicitar uma tomografia daria uma melhor qualidade da imagem da cavidade pleural e também pode ajudar a identificar a causa do derrame. Contudo, dependendo do local onde fica esse recurso no seu hospital e a velocidade que leva para obtê-lo, quase sempre é melhor solicitar um Rx-Tórax primeiro, assim como, se possível, realizar um USG a beira leito. Isso já daria muita informação sobre a patologia.

Confira a imagem 3 relacionada ao derrame pleural bilateral!
Rx-Tórax.
Confira a imagem 4 relacionada ao tópico em questão!
USG a beira leito.

E agora, qual é o próximo passo para enfrentar o derrame pleural bilateral?

Como o objetivo deste texto é discutir sobre derrame bilateral com causa provável não identificada ou na dúvida diagnóstica, avançaremos no nosso arsenal de ferramentas e realizaremos uma paracentese diagnóstica.

Confira a imagem 5 relacionada ao tópico em questão!
Paracentese diagnóstica.

Em resumo, você colocará uma agulha calibrosa na região infraescapular com o objetivo de drenar o derrame, proporcionar certo alívio dos sintomas e coletar exames.

Ficou interessado em dominar essa técnica? Então, recomendo ler o nosso artigo sobre toracocentese: tudo o que você precisa saber.

Após a retirada do líquido

E o que eu faço com esse líquido? Que exames eu solicito? O que eu quero ver com eles? 

Mantenha a calma e fosforila aqui comigo. Lembra que eu falei no início desse texto que esse líquido está na cavidade pleural por uma quebra de equilíbrio entre produção e absorção? 

Bom, isso pode ser dito como um transudato, ou seja, extravasamento de líquido por um aumento na pressão hidrostática ou redução da pressão oncótica.

Porém, há outro mecanismo de acúmulo de líquido na região denominado exsudato. Ele se relaciona com a maior concentração de células no local, resultado de um processo inflamatório subjacente.

Sabendo disso, conseguimos entender os critérios de light. Esses critérios nos ajudam a distinguir a origem desses derrames e para isso, precisamos de amostras pareadas de:

  • proteínas séricas X proteínas pleural;
  • Dhl Sérico C Dhl Pleural.

Vamos estudar também: no líquido pleural → PH, culturas para micro-organismos, bacterioscopia, contagem total de células, glicose, amilase, hematócrito, triglicerídios, quilomícrons, colesterol, ADA.

Ora, se eu estou pensando numa condição que está mais relacionada a um aumento da concentração de proteínas no local, como resultado de um processo inflamatório, infeccioso ou neoplásico, espera-se que a concentração de proteínas ali, na cavidade pleural, seja maior em relação a concentração de proteínas séricas

Logo, descobrimos o racional de um dos critérios de light, na qual se a relação proteínas pleurais sobre proteínas séricas for superior a 0,5, estamos diante de um exsudato. De modo análogo, pensamos sobre o dhl, aumentado em condições de insultos inflamatórios.

Na tabela abaixo, temos um resumo das principais causas de derrame pleural divididos entre exsudato X transudatos.

Confira a imagem 6 relacionada ao derrame pleural bilateral!
Causas do derrame pleural (Transudato x Exsudato)

Posso fazer mais alguma coisa?

O tratamento para o derrame pleural deve ser voltado para sua causa de base, ou seja, o que o gerou. Aqueles derrames pleurais de grande monta, responsáveis por deixar o paciente muito sintomático, irão se beneficiar da toracocentese de alívio. Ao performar a toracocentese diagnóstica, já podemos aproveitar e tirar até 1,5 litros de fluidos da região, com objetivo de melhorar os sintomas. 

Sobre o derrame pleural bilateral, é isso!

Ufa, pessoal, bastante coisa, hein?! O objetivo aqui foi explicar um apanhado geral sobre o derrame pleural para que no final fosse especificado como proceder diante de um derrame pleural bilateral.

Lembre-se dos sinais de instabilidade hemodinâmica, critérios de light e que o derrame pleural bilateral é secundário a outra injúria a qual devemos investigar.

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LuizCésar

Luiz César

Nascido em 1990, em Cuiabá-MT, formado pela Universidade Estadual de Campinas (UNICAMP) em 2020. Experiência como oficial médico temporário no 37° Batalhão de infantaria leve. Residência em Medicina de Emergência na Universidade de São Paulo (USP - SP). Amante da adrenalina se interessa por resgate aeromédico, usg-point of care e medicina de áreas remotas.