E ai, pessoal! Tudo bem? Hoje vamos falar sobre a Síndrome de Dressler, de que muitos nunca ouviram falar. “Ah, é aquela síndrome que acomete a pele, né?” Não! A síndrome que acomete a pele é a Síndrome de Dress, apenas. A Síndrome de Dressler é um acometimento pericárdico que ocorre após o Infarto Miocárdico.
Bora lá aprender um pouco mais sobre isso, para você voar nas discussões, beleza?
A pericardite é uma condição na qual o pericárdio (um saco fibroelástico que envolve o coração) fica inflamado. O pericárdio é composto por uma camada visceral (formado por células mesoteliais, que se encontram aderidas ao epicárdio do coração) e por uma camada parietal (uma camada mais fibrosa, composta por colágeno e elastina), sendo que tais camadas são separadas por um espaço virtual: a cavidade pericárdica.
Em circunstâncias normais, a cavidade pericárdica contém 15 a 50ml de líquido pericárdico (um ultrafiltrado de plasma). Quando temos uma pericardite, com ou sem derrame pericárdico, decorrente de lesão do miocárdio ou do pericárdio, temos a formação da “Síndrome Pós-Lesão Cardíaca”.
As principais condições que geram essa síndrome são:
– Trauma contuso / penetrante
– Iatrogênica pós-intervenções coronárias percutâneas
– Intra-cardíacas
Cada uma das condições acima representa uma condição clínica distinta caracterizada por uma lesão cardíaca inicial envolvendo o pericárdio e/ou miocárdio e a síndrome inflamatória subsequente à injúria. Isso varia desde pericardite simples não complicada a casos mais complexos, como pleuro-pericardite, tamponamento cardíaco ou derrame pleural maciço.
Termos muito complexos, né? Mas fiquem tranquilos, que hoje focaremos apenas na Síndrome Pós-Infarto do Miocárdio. A Síndrome Pós-Lesão Cardíaca, que ocorre após um evento de infarto agudo do miocárdio, também é conhecida como Síndrome de Dressler!
A Síndrome de Dressler (SD), também conhecida como Síndrome Pós-Infarto do Miocárdio, é uma forma de pericardite secundária, com ou sem derrame pericárdico, que ocorre tardiamente (cerca de 2 a 12 semanas após o evento agudo do IAM) em decorrência de lesão cardíaca ou pericárdica.
A causa exata da Síndrome de Dressler não é bem conhecida. Acredita-se que uma lesão inicial nas células mesoteliais do pericárdio (ou seja, no pericárdio visceral), associada à presença de sangue no espaço pericárdico, desencadeia uma resposta inflamatória, tendo como consequência o depósito de imunocomplexos nas regiões do pericárdio, miocárdio e até na pleura. A inflamação do pericárdio pode gerar acúmulo de líquidos na cavidade pericárdica (derrame pericárdico) e também na pleura (derrame pleural).
O acúmulo progressivo desse líquido pode pressionar o coração, impedindo o bombeamento eficaz de sangue. A resposta do sistema imunológico que leva à SD também pode causar acúmulo de líquido nas membranas ao redor dos pulmões (derrame pleural).
Acredita-se que essa síndrome seja decorrente de um mecanismo imune devido ao período de tempo entre o momento em que ocorre a injúria cardíaca e o desenvolvimento da síndrome pós-lesão cardíaca, sendo que pode ser precoce (< 1 semana do evento agudo) ou tardio (2 a 12 semanas após o evento = Síndrome de Dressler). Outro fato que reforça essa teoria é que os pacientes respondem bem a tratamento com antiinflamatórios.
A incidência prévia da Síndrome de Dressler era de aproximadamente 3 a 4% em pacientes com Infarto do Miocárdio. Entretanto, com a terapia de reperfusão coronariana, houve uma redução da incidência desta síndrome. Isso porque, com técnicas bem-sucedidas, há uma redução da área de isquemia, com menor dano ao miocárdio e, assim, reduzindo a resposta imunomediadas.
Um ponto importante é que existem fatores predisponentes para Síndrome de Dressler:
E quando vou suspeitar de Síndrome de Dressler? Primeiro, SEMPRE avaliar o antecedente de Infarto do Miocárdio recente e a questão da temporalidade (deve estar ocorrendo cerca de 2 a 12 semanas após o evento agudo). O paciente vai chegar no PS referindo para você uma dor torácica precordial, súbita, com características pleuríticas (ou seja, com melhora com a posição supina e piora com o decúbito dorsal). Outro ponto importante é a queixa de febre (em geral baixa), palpitações, hiporexia e mal-estar inespecífico.
Um dos pontos mais importantes no exame físico é a avaliação dos sinais vitais, podendo ser notada taquicardia (com ou sem febre). Na ausculta cardíaca, pode ser notado atrito pericárdico, mas, atenção: o desaparecimento do atrito pericárdico pode ser por melhora clínica ou por acúmulo de líquido pericárdico e, dessa forma, não deve ser utilizado como forma preditiva de Síndrome de Dressler.
Outro aspecto que pode ser observado no exame físico é a presença de Pulso Paradoxal (em contexto de derrame pericárdico, pericardite constritiva ou tamponamento cardíaco associado). E o que é mesmo Pulso Paradoxal? Recordar é viver… Pulso paradoxal corresponde à diminuição da PAS maior do que 10 mmHg com a inspiração.
Além disso podemos notar sinais de pneumonite (lembre-se, há uma reação imunomediada), como tosse, queda de saturação e até derrame pleural.
Aí está um dos pontos fundamentais da avaliação. O ECG de um paciente com Síndrome de Dressler pode evidenciar supra-ST difuso, infra do segmento PR e inversão da onda T, como na pericardite. Alternância elétrica (variações na amplitude do QRS) ou QRS de baixa voltagem podem ser observados em caso de derrame pericárdico de grande volume.
Do ponto de vista de exames laboratoriais, em exames séricos pode-se notar leucocitose e aumento de provas inflamatórias, como PCR e VHS. Além disso, sempre devemos solicitar hemoculturas no início da investigação, para diferenciar causas inflamatórias de infecciosas. No caso da Síndrome de Dressler, as hemoculturas devem ser negativas.
O exame considerado padrão no estudo de imagem é o ecocardiograma. Através do ecocardiograma será possível avaliar a presença de derrame pericárdico, avaliar contratilidade ventricular, risco de evoluir com tamponamento cardíaco (corra, meu amigo!). Também podemos definir a causa do baixo débito cardíaco (paciente está com síndrome de Dressler ou com insuficiência cardíaca após IAM?).
Através de uma radiografia de tórax, é possível avaliar aumento da silhueta cardíaca (em caso de derrame pericárdico) e obliteração do seio costofrênico (em caso de derrame pleural associado).
O tratamento da maioria dos pacientes com Síndrome de Dressler pode ser realizado em regime ambulatorial, desde que ocorra seguimento rigoroso. O tratamento deverá ocorrer em ambiente hospitalar em contexto de instabilidade hemodinâmica. A recorrência da síndrome é comum.
O objetivo do tratamento é o controle álgico e redução da inflamação do pericárdio.
Considerando a eficácia da Colchicina em outras doenças inflamatórias do pericárdio, ela também pode ser eficaz no tratamento da Síndrome Pós-Lesão Cardíaca (embora existam dados limitados).
Há mais estudos no eu uso em pacientes após cirurgia cardíaca, sendo que nestes o tratamento combinado de colchicina e um antiinflamatório determinaram menor probabilidade de necessitar de intervenção (ou seja, pericardiocentese, janela pericárdica, pericardiectomia) para complicações da síndrome pós-lesão cardíaca.
As diretrizes da Sociedade Europeia de Cardiologia de 2015 reforçam o uso rotineiro de colchicina para o tratamento da síndrome pós-lesão cardíaca.
Dose inicial: 0,5 – 0,6 mg 2x/dia;
Tempo médio de tratamento: 6 meses.
A indicação de drenagem pericárdica ocorre em casos graves de Síndrome de Dressler, como no caso de pericardite constritiva ou tamponamento cardíaco iminente.
A pericardiocentese com posterior drenagem pericárdica, além de início concomitante com terapia antiinflamatória, é considerado o tratamento padrão nos casos com derrame pericárdio significativo.
A complicação mais temida da Síndrome de Dressler é o tamponamento cardíaco, que leva ao risco de colapso cardiovascular. O acúmulo de líquido na cavidade pericárdica, que usualmente acontece na Síndrome, compromete o relaxamento do coração, com falha no enchimento ventricular.
O tamponamento cardíaco pode ser reconhecido através da famosa Tríade de Beck:
O tamponamento cardíaco é uma emergência médica, necessitando de reconhecimento e de ação rápida. À identificação, proceder com pericardiocentese para resolução do choque cardiovascular.
É isso, pessoal! Esperamos que tudo tenha ficado claro e que você tenha compreendido o conteúdo!
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Residência em Clínica Médica no Hospital das Clínicas da FMUSP. Graduação em Medicina pela Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo. Intercâmbio acadêmico em estágio de pesquisa científica na Harvard Medical School/Brigham and Women's Hospital. Experiência como Médica-Preceptora da Disciplina de Emergências Clínicas da FMUSP.