Sintomas da anemia falciforme: de A a Z

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Fala, pessoal! Se você clicou neste post, está interessado neste riquíssimo tema que trata dos principais sintomas da anemia falciforme. Afinal, se você já pegou uma porta de pronto-socorro, um caso como esse provavelmente já caiu nas suas mãos. E se não caiu ainda, você está em vantagem, pois já atenderá o paciente sendo um craque no assunto. Então, bora começar!

Anemia falciforme: do que se trata?

Nada mais justo que começar um texto sobre os sintomas da anemia falciforme explicando um pouco mais sobre essa doença. Assim, podemos dizer que é uma anemia crônica causada pela destruição excessiva de glóbulos vermelhos anormais, em forma de foice (ou meia-lua), como o próprio nome já nos diz. Ela é uma herança genética e está mais relacionada à etnia negra, representando, nos Estados Unidos, cerca de 10% dessa parcela população. No Brasil, de 0,1% a 0,3% dos indivíduos pertencentes à etnia mencionada são acometidos.

De cara, precisamos diferenciar essa patologia do traço falciforme. Apesar de serem parecidas no nome, enquanto a anemia falciforme é a expressão clínica dos homozigotos, o traço falciforme é reservado aos heterozigotos. Beleza, mas o que isso representa na prática? Aqueles que possuem apenas o traço falciforme costumam ser assintomáticos, enquanto os que carregam a doença manifestam de fato a anemia hemolítica e suas complicações.

Essas complicações tendem a ocorrer no primeiro ano de vida daqueles que possuem a anemia falciforme, e podem demonstrar diversas formas de apresentação clínica:

  • crises vaso-oclusivas; 
  • síndrome torácica aguda;
  • sequestro esplênico;
  • entre outros.

Mas você pode ficar tranquilo, que vamos destrinchar cada um desses sintomas da anemia falciforme para você ficar ligado.

Sintomas da anemia falciforme: crises vaso-oclusivas

São crises extremamente dolorosas, causadas pela oclusão da microcirculação por aquelas hemácias falcizadas que comentamos no início deste post. Elas podem começar logo no início de vida (entre 6 meses e 1 ano) e se repetir ao longo dela, causando principalmente dores lombares, articulares e ósseas. Deve-se ter o cuidado de analisar qual condição desencadeou essa crise pois, apesar de poder ser espontânea, pode ser precedida por hipóxia, desidratação ou infecção.

Tratamento

Devemos começar monitorizando e escalonando a dor desse paciente, realizando a analgesia adequada de acordo com a intensidade referida por ele. Na tabela abaixo, podemos ver um exemplo:

Confira a imagem 1 associada ao tema dos sintomas da anemia falciforme!
Imagem 1. Exemplo de analgesia adequada. Fonte: Medicina de Emergência: Abordagem Prática FMUSP – 14ª Ed.

Além da analgesia, devemos prestar atenção na hidratação, sendo recomendado uma hidratação com aporte de 50 ml/kg nas primeiras 24 horas, lembrando de tratar qualquer condição infecciosa, caso apresente.

Sintomas da anemia falciforme: síndrome torácica aguda

Nos indivíduos com anemia falciforme, essa complicação pode tanto ocorrer após a crise vaso-oclusiva discutida acima quanto isoladamente. Sua etiologia ainda não está muito esclarecida, podendo ocorrer por embolia gordurosa após a necrose óssea causada por vaso oclusão ou por agentes infecciosos. Fato é que todo paciente falcêmico deve deve nos acender uma luz vermelha caso apresente os seguintes sintomas, pois estaremos diante de uma síndrome torácica aguda:

  • dor torácica;
  • febre;
  • hipoxemia;
  • tosse;
  • sibilância;
  • infiltrado pulmonar novo.

E o que fazer?

Começaremos pela monitorização, hidratação e analgesia também, como na crise vaso-oclusiva. Também ofertamos antibioticoterapia empírica nesses casos com cobertura para germes encapsulados (cefalosporinas de 3ª geração são bem-vindas) e germes atípicos (aqui entram os macrolídeos).

Oxigenoterapia com alvo de saturação maior ou igual a 95% e o queridinho para esta condição: espirometria de incentivo! Nela, vamos estimular inspirações profundas a partir de dispositivos próprios, diminuindo, assim, a evolução de risco. 

Deve-se também avaliar a necessidade de transfusão sanguínea cautelosa, mantendo uma Hb maior ou igual a 10 mg/dL, a depender da hemoglobina basal do paciente e de qual foi a queda nesta condição.

Sintomas relativos à anemia falciforme: sequestro esplênico

O sequestro esplênico é uma condição grave, associada a grande morbidade e mortalidade da anemia falciforme. Em sua grande maioria, apresenta-se com choque hipovolêmico e é identificado por uma queda maior ou igual a 2 g/dL na hemoglobina basal do paciente falcêmico e aumento não só da eritropoiese, mas também das dimensões do baço. Vale lembrar que os pacientes já possuem um aumento de baço, sendo importante saber qual é o valor basal deste e, acredite: normalmente, o próprio paciente ou os responsáveis por ele vão saber.

Como manejar?

Não muito diferente das outras complicações, aqui também monitorizamos o paciente e realizamos a expansão volêmica. Além disso, a transfusão sanguínea aqui se torna necessária, tomando sempre cuidado com a hiperviscosidade do sangue, mantendo uma Hb menor ou igual a 8% para não piorar a situação do nosso doente.

Devido à frequente recorrência, o paciente que apresentar sequestro esplênico deverá realizar tratamento preventivo com hidroxiuréia.

Dando continuidade aos sintomas: o priapismo

Complicação comum em homens com anemia falciforme, o priapismo é a vaso-oclusão dos corpos cavernosos com obstrução do fluxo venoso, levando à uma ereção prolongada e dolorosa.

E qual o tratamento?

Mais uma vez, estão presentes a hidratação e a analgesia conforme escala da dor, mas aqui também podemos lançar mão da aspiração e irrigação dos corpos cavernosos a cada 12 horas, se necessário. Caso o episódio dure entre 24 a 48 horas, considera-se procedimento cirúrgico.

Ufa! Tratamos aqui das principais complicações agudas que a anemia falciforme pode apresentar, mas fica a dúvida: e as complicações crônicas?

Complicações crônicas da anemia falciforme

Após a quinta década de vida convivendo com a hemólise provocada por essa doença, algumas condições podem se evidenciar, como a hipertensão pulmonar e a nefropatia. A primeira, caracterizada por uma velocidade regurgitante da tricúspide lentificada, causa estase e, posteriormente, hipertensão pulmonar. Já a segunda, nefropatia, pode ocorrer na população mais jovem, mas a maior prevalência de insuficiência renal ou síndrome nefrótica se dá no envelhecimento da população acometida pela anemia falciforme, tendo uma sobrevida de 4 anos, mesmo com diálise.

Bom, pudemos ver até aqui que apesar de grave, a anemia falciforme não é nenhum bicho de sete cabeças, né? Entendendo um pouco da fisiopatologia da doença, da oclusão causada na microcirculação por essas hemácias em meia-lua, conseguimos destrinchar suas principais complicações. E digo mais: se você puder levar uma única coisa deste artigo, acredito que você já até saiba qual é: se ler anemia falciforme no prontuário, saiba que hidratação e analgesia são itens obrigatórios!

E não esqueça: esses pacientes precisam de um acompanhamento hematológico para evitar as complicações crônicas, já que estas diminuem significativamente sua sobrevida.

É isso, pessoal!

Ficou com alguma dúvida acerca do assunto? Deixe um comentário aqui embaixo! Será um prazer respondê-lo!

Caso vocês ainda não dominem o plantão de pronto-socorro 100%, fica aqui uma sugestão: temos um material que pode te ajudar com isso, que é o nosso Guia de Prescrições. Com ele, você vai estar muito mais preparado para atuar em qualquer sala de emergência do Brasil.

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anemi

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AnuarSaleh

Anuar Saleh

Nascido em 1993, em Maringá, se formou em Medicina pela UEM (Universidade Estadual de Maringá). Residência em Medicina de Emergência pelo Hospital Israelita Albert Einstein.