Amenorreias secundárias: o que você precisa saber para diagnosticar e tratar

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Você sabia que “amenorreia” é um dos principais temas de ginecologia nas provas de residência? As questões sobre as amenorreias secundárias seguem sempre o mesmo raciocínio, então depois de aprender você não vai errar mais!

Então vem com a Medway e bora esclarecer tudo isso e finalmente entender: por que parou? Parou por quê? Vocês vão ver, nem sempre uma mulher que parou de menstruar está grávida, existem muitas outras possibilidades!

Definição das amenorreias secundárias

Chamamos de “amenorreia secundária” quando uma mulher que já apresentou a menarca para de menstruar. Mas aqui sempre devemos diferenciar de uma irregularidade da menstruação. Por isso, também precisamos de alguns critérios para definir como amenorreia secundária:

  • a menarca já ocorreu, porém a paciente fica sem menstruar por 3 meses seguidos;
  • ocorrência de menos de nove menstruações em um ano.

Investigação das amenorreias secundárias

O fluxograma de investigação da primária e da secundária são diferentes! Nesse post vamos falar sobre o diagnóstico das amenorreias secundárias. Não deixe de conferir também o nosso minucioso post sobre o diagnóstico das amenorreias primárias.

Imaginem-se frente a uma paciente que te conta que estava menstruando normalmente, porém parou de menstruar nos últimos meses. A primeira coisa que você deve se perguntar nesse caso é “será que ela está grávida?”.

Para responder isso, vale investigar outros sintomas de gestação, bem como avaliar o uso de anticoncepcionais e o histórico das atividades sexuais dela. 

Por exemplo, alguns contraceptivos podem levar à amenorreia, como o Implanom, os injetáveis trimestrais e os dispositivos intrauterinos de levonorgestrel. Aliás, não deixe de conferir nossos posts sobre DIUs, contraceptivos injetáveis e sobre anticoncepcionais combinados!

Mesmo com uma história bem definida, difícil fugir da realização de um beta-hCG, como mostra o primeiro passo do fluxograma a seguir:

Base da investigação de Amenorreias secundárias (Fonte: Acervo Medway.)

Então, vamos destrinchando esse fluxograma e vamos ver os passos para investigar uma amenorreia secundária.

Fluxograma de investigação – PASSO A PASSO

Como falamos, ATENÇÃO! Vamos começar excluindo a principal causa: Noah ou Gael ou Valentina chegando! (GRAVIDEZ)

Descartar gravidez: 

Muito importante, sempre pedir o beta como primeiro passo! Se ele vier positivo, devemos trocar o capítulo de estudo e passar para a Obstetrícia. Por isso, nunca podemos comer essa bola nas amenorreias secundárias e sempre investigar a gestação.

Solicitar TSH e prolactina.

Após descartada gravidez bora raciocinar!

Uma das principais causas de amenorreias secundárias são as condições que levam à anovulação. Duas situações extremamente comuns são as alterações tireoidianas e a hiperprolactinemia. Por este motivo, o TSH e a dosagem de prolactina devem ser realizados já no início da investigação.

Hiperprolactinemia 

As alterações que podem aumentar a prolactina são diversas e frequentemente se expressa clinicamente com a associação de GALACTORREIA + AMENORREIA + INFERTILIDADE.

Podemos inclusive ter causas fisiológicas que levam ao aumento deste hormônio, como o puerpério, gestações e a maior estimulação mamilar. 

Porém, sempre devemos avaliar outras condições patológicas, como o hipotireoidismo (que pode cursar com hiperprolactinemia secundária!), alterações renais, hepáticas e o uso de alguns medicamentos, aqui ressaltando-se o uso de opioides, antipsicóticos, tricíclicos e antieméticos. 

Além disso, alguns tumores de sela túrcica também podem aumentar a prolactina e devem ser investigados, em especial quando temos associação com cefaleia ou redução do campo visual. 

Porém, em muitos casos, não conseguimos chegar em uma etiologia e temos que classificar a hiperprolactinemia como “idiopática”, ou seja, sem causa definida.

Hipo/Hipertireoidismo

As alterações da tireoide, tanto para mais (hiper) como para menos (hipo) podem influenciar o eixo hipotálamo-hipófise-ovariano e, por consequência, levar a amenorreias. 

Muitas vezes, essas condições podem se associar a outros sintomas, como alterações cutâneas, oculares, fraqueza de unhas e cabelos, tremores e etc., contudo, alguns casos são oligo/assintomáticos e requerem a dosagem de TSH para serem identificados. 

Teste da progesterona

Agora vai ficar quente, porque isso aqui sempre cai em prova! O próximo passo é pedir o teste da progesterona. Neste teste, fornecemos à paciente uma dosagem de progesterona por duas semanas e, após sua retirada, observamos se houve ou não a menstruação.

Esse teste consegue identificar alterações ovulatórias. Pensem comigo: se eu der progesterona e a paciente menstruar, significa que a única coisa que faltava para isso acontecer é a progesterona, que é produzida pelo corpo lúteo após a ovulação! Portanto, ela não está ovulando. 

Lembrem-se, o endométrio só irá conseguir descamar na menstruação após um primeiro estímulo estrogênico, que torna esse endométrio proliferativo, seguido de uma transformação progesterônica em endométrio secretor. 

Sendo assim, a menstruação após o teste da progesterona também demonstra que esse endométrio foi previamente exposto ao estrogênio.

Vamos ver quais as principais causas de amenorreias a depender do resultado do teste da progesterona:

Se ela menstruar: teste positivo

Caso o teste dê positivo: significa que a paciente possui útero, não há obstrução à menstruação e que ela tem estrogênio suficiente circulando (endométrio já estava proliferado para poder descamar).

Sendo assim, podemos inferir que ela tem uma anovulação crônica. Como possibilidades diagnósticas, devemos avaliar a Síndrome dos Ovários Policísticos (SOP), a hiperplasia adrenal congênita e a obesidade.

Se ela não menstruar: teste negativo

Nessa situação, deveremos prosseguir com a investigação. 

Teste do estrogênio + progesterona

Se não houve menstruação somente com ajuda da progesterona, precisamos avaliar se também há deficiência de estrogênio. 

Por isso, vamos realizar o teste do estrogênio + progesterona, no qual fazemos uma fase inicial somente com estrogênio e uma segunda fase combinando estrogênio + progesterona. 

Agora, estamos dando tudo para esta mulher! O estrogênio vai proliferar o endométrio e nos últimos 5 dias vamos dar progesterona também! É quase um ciclo menstrual completo! 

Depois desse boom hormonal, seguido de queda abrupta, caso a mulher tenha um endométrio adequado e responsivo a hormônios, ela deveria menstruar!

Visto isso, vamos pensar. Se ela não menstruar, o que será que pode estar acontecendo? Deve haver alguma alteração no trato de saída ou na resposta endometrial. 

Teste negativo: o problema é anatômico!

Nesse caso, podemos ter algumas possibilidades, como a síndrome de Asherman, na qual identificamos múltiplas sinéquias uterinas decorrentes de seguidas curetagens uterinas ou infecções endometriais. 

Aqui, o endométrio não consegue se tornar proliferativo mesmo sob estímulo exógeno de estradiol e nem descama após a suplementação de progesterona. 

Uma segunda possibilidade é a estenose de colo uterino em que, por alguma razão, há uma obstrução mecânica da via de saída da menstruação. Com isso, apesar de o sangue menstrual ser produzido, ele não consegue ser exteriorizado.

Teste positivo: estamos frente a um hipogonadismo! 

Se o teste do estrogênio + progesterona for positivo, devemos concluir que o útero é responsivo a esses hormônios e que o que está faltando é a produção de estradiol, não apenas a ovulação.

As deficiências de estrogênio podem ser chamadas de hipogonadismo e podem ter origem em diversas alterações. O próximo passo será exatamente entender onde está essa alteração!

Dosagem de FSH

A dosagem do FSH vai ajudar a determinar se a deficiência da produção de estradiol (hipogonadismo) é resultante de um defeito periférico, ou seja, ovariana, ou de um defeito central (hipotálamo ou hipófise)

FSH alto: 

Caso o FSH seja alto, podemos definir que há um problema periférico – as gônadas não estão respondendo ao FSH. Imaginem aqui que a hipófise está tentando, com todas as suas forças estimular um ovário irresponsivo. 

É exatamente isso que está ocorrendo. Apesar da alta produção de FSH hipofisário, os ovários tem alterações que os impede de produzir estradiol, independente da concentração de gonadotrofinas.

Aqui as principais causas são:

  • disgenesia gonada;
  • síndrome de Turner;
  • insuficiência ovariana prematura.

FSH baixo

Nesse caso, o problema é central e o FSH não está sendo adequadamente produzido e não está chegando para estimular as gônadas.

Aqui ainda precisamos descobrir se o defeito é lá em cima no hipotálamo ou um pouco mais abaixo na hipófise.

  1. Teste do GnRH 

Para definir a causa da alteração central, devemos prosseguir a investigação com a solicitação de uma RM ou uma TC de crânio e também com a realização do teste do GnRH.

O teste do GnRH é realizado a partir de um estímulo com GnRH ou com seu agonista, que deverá estimular a hipófise a produzir gonadotrofinas. Em seguida, iremos dosar FSH e LH e avaliar se a hipófise respondeu a esse estímulo ou não. 

Teste do GnRH positivo

Se liberar FSH/LH após estímulo, a hipófise está funcionando. Então o defeito é hipotalâmico. Nesse caso, temos algumas possibilidades diagnósticas:

  • deficiência isolada de gonadotrofinas;
  • hiperprolactinemia;
  • hiper/hipotireoidismo;
  • estresse/anorexia/exercício físico intenso/desnutrição.
Teste do GnRH negativo

Se não liberar FSH/LH, significa que a hipófise está irresponsiva e, portanto, o defeito é hipofisário. Isso pode acontecer nos casos de:

  • tumores centrais, que acometem a sela túrcica;
  • síndrome de Sheehan, uma condição em que, após um sangramento puerperal grave, observa-se uma necrose hipofisária, levando a sintomas de pan-hipopituitarismo. Nesses casos, tipicamente a paciente irá apresentar um sangramento obstétrico importante (ex: uma hemorragia pós-parto por uma atonia uterina) e pode inclusive não conseguir amamentar, pela deficiência de prolactina, outro hormônio produzido pela hipósfise. 

Quadro-resumo

Vimos diversas causas de amenorreias secundárias e descrevemos como fazer o passo-a-passo para identificar a topologia da alteração responsável pela ausência da menstruação. 

Vamos agora reorganizar essas causas em um quadro que resume as principais etiologias e em qual “compartimento” está o defeito. Observe o quadro a seguir:

Imagem x. Principais causas de amenorreia. (Fonte: Acervo MEDWAY)

É isso!

A amenorreia é um sintoma que deve ser investigado e que pode nos levar para o diagnóstico de diversas patologias. 

Apesar de parecer complexo, caso siga-se um racional diagnóstico lógico não fica difícil de encontrar onde está o problema e, juntamente com uma boa história clínica, conseguimos chegar a um diagnóstico (que geralmente vai ser a resposta da sua questão na prova de Residência!). 

E é isso que a Medway ajuda vocês fazerem. Nós estamos aqui para facilitar o raciocínio clínico e aprimorar seus conhecimentos médicos. 

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FredericoTimm

Frederico Timm

Gaúcho. Médico formado pela UFPEL, residente de Ginecologia e Obstetrícia na UFMG. Tenho 2,04m de altura, sou cozinheiro cria da quarentena e tenho FOAMed na veia. Bora junto!