Elevação de Troponina: quais são as causas?

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Fala, pessoal! Hoje vamos falar das causas da elevação de troponina. Vamos supor que você está no seu plantão de pronto-socorro resolvendo suas pendências quando, de repente, o telefone toca: é o laboratório informando resultado crítico do paciente que você atendeu há pouco tempo. 

“Doutor, troponina com resultado crítico, repetido e confirmado!” 

E agora, o que você faz? Lembrando-se dos tempos de faculdade, você logo se recorda que a troponina é uma enzima específica para injúrias miocárdicas, e já logo pensa que seu paciente está infartando. E aí? Ligar para o cardiologista ou hemodinâmica? Solicitar vaga de UTI? Iniciar medidas cardioprotetoras? 

Calma! A troponina, de fato, é uma enzima cardioespecífica liberada em situações de injúria miocárdica, porém ela possui diversas causas para o seu aumento não relacionadas com doenças coronarianas e infarto agudo do miocárdio (IAM). 

Antes de se desesperar, sempre pense nas possíveis etiologias de alteração enzimática. Hoje vamos abordar, aqui, as causas de elevação de troponina para você poder esbanjar conhecimento nos seus plantões, além de fazer a diferença para seus pacientes. 

Elevação de troponina: fisiologia

As enzimas Troponina I e Troponina T são biomarcadores para injúria miocárdica muito utilizadas na prática clínica em contexto de urgência e de UTI. São proteínas regulatórias que controlam a relação entre o cálcio e a actina e a miosina

Elas são detectáveis no sangue plasmático no contexto de dano celular miocárdio com liberação de conteúdo intracelular para o extracelular, assim como a CK, mioglobina e DHL, porém, também podem ser detectáveis no contexto de aumento de permeabilidade de membrana (ex: sepse). 

A Troponina é aferida nos exames convencionais através do uso de anticorpos monoclonais que se ligam às enzimas, podendo identificá-las e quantificá-las. Cada teste é diferente um do outro, então, é fundamental avaliar os valores de referência de cada kit de exame antes de afirmar se o valor está aumentado ou não. 

Em geral, para o diagnóstico de elevação de troponina, utiliza-se o limite laboratorial de percentil > 99% ou > 3 desvios padrões superior para cada sexo. 

Mas então como pode haver liberação de troponina na ausência de infarto agudo do miocárdio, o famoso IAM, que tanto assombra os plantonistas? 

De fato, o tradicional IAM é a principal causa de elevação de troponina no contexto de urgência, devido à redução de fornecimento de oxigênio através das coronárias parcialmente ou totalmente ocluídas pelo evento trombótico. 

No entanto, há outras causas de aumento de troponina que ocorrem devido ao desbalanço entre oferta x demanda de oxigênio (taquiarritmias, sepse, estado de choque, ICC, grande queimado, etc…). 

Nesse contexto, foi cunhado o termo IAM Tipo 2, quando há isquemia e dano miocárdio devido ao desbalanço entre oferta x demanda e na ausência de evento trombótico coronariano primário. 

Além disso, há outras causas de liberação direta de troponina sem desbalanço energético envolvido, explicadas por teorias que envolvem efeitos catecolaminérgicos e inflamatórios sistêmicos por condições como sepse ou até mesmo DRC em estágios avançados. 

Agora que passamos por cima da fisiologia envolvida na liberação e detecção de troponina no sangue, vamos para o que interessa e sem enrolação: as causas de elevação de troponina!

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Principais etiologias da elevação de troponina

Infarto agudo do miocárdio (IAM Tipo 1)

Falaremos, brevemente, sobre o IAM, pois o objetivo de hoje é esclarecer outras causas de elevação de troponina

A principal etiologia de elevação de troponina na emergência é o famoso IAM (tipo 1), resultado do desbalanço de oferta x consumo de O2, devido à doença arterial coronariana com oclusão de vasos após a ruptura/erosão de placas ateroscleróticas. 

O desbalanço energético por redução no aporte de O2 resulta em lesão de cardiomiócitos e liberação de troponina. 

Sempre é bom lembrar que, para o diagnóstico do IAM, precisamos avaliar o contexto em que o paciente está inserido, a fim de evitar erros diagnósticos. 

Deve-se sempre estar atento à clínica apresentada pelo paciente e também buscar por alterações eletrocardiográficas, para, então, classificar como Síndrome Coronariana Aguda (SCA) e suas subdivisões IAMSSST/IAMCSST/Angina Instável. 

Saiba mais sobre as causas da elevação de troponina!
Saiba mais sobre as causas da elevação de troponina!

Sepse/Choque Séptico

Os pacientes em estado de sepse e/ou choque séptico são um dos que mais cursam com aumento de troponina sem doença coronariana associada, devido ao desbalanço importante entre oferta x demanda de oxigênio, além de um estado inflamatório acentuado com liberação de citocinas que estão relacionadas com o dano miocárdico. 

No estado de sepse, o paciente está em um estado hiperdinâmico cardíaco, na tentativa de manutenção de perfusão global tecidual. Muitas vezes, a DC está aumentando e a taquicardia é acentuada (outro motivo de elevação de troponina que abordaremos a seguir). 

Em estados avançados, o paciente séptico, muitas vezes, evolui com disfunção miocárdica associada ao quadro distributivo. 

A elevação de troponina, nos pacientes sépticos, é um marcador de mal-prognóstico, ou seja, está associada à maior morbimortalidade.

Doença Renal Crônica (DRC): 

Sabe-se que a DRC, principalmente em estágios avançados (G4/G5), cursam com elevação de troponina sem associação com Infarto Agudo do Miocárdio. 

Há um debate sobre o principal componente dessa elevação enzimática, mas se entende que há associação de redução de clearance renal e com o aumento da liberação pelo miocárdio sem relação com doença coronariana. 

Para esses pacientes com níveis anormalmente elevados de troponina, a fim de se diagnosticar um IAM, utiliza-se medidas seriadas para avaliar elevações ou quedas que sugiram evento isquêmico agudo (não utilizar um único valor isolado). A troponina no contexto de DRC é um fator de pior prognóstico cardiovascular. 

Taquicardias

A taquicardia isolada é sabidamente uma causa para elevação de troponina, pois a perfusão coronariana ocorre majoritariamente na fase diastólica do ciclo cardíaco. 

Devido à taquicardia, o tempo de enchimento coronariano diastólico é prejudicado, podendo conferir, com isso, um desbalanço importante na relação oferta x demanda de O2 para o miocárdio. 

Não é raro um paciente que apresenta uma fibrilação atrial de alta resposta ventricular (FAARV) apresentar elevação de troponina sem estar relacionado com doença coronariana subjacente. 

A elevação da FC contribui também, dessa maneira, para a elevação de troponina no contexto de sepse, conforme explicado anteriormente. 

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Insuficiência Cardíaca

O aumento de troponina está associado a estados avançados de Insuficiência Cardíaca e também a pior prognóstico nesses casos. Os dois mecanismos conhecidos para o aumento da enzima na IC são aumento de tensão miocárdica e morte celular. 

Há uma relação estrita entre aumento de troponina e aumento de BNP: ambos são marcadores de pior prognóstico na IC e estão relacionados à sobrecarga pressórica e volumétrica de câmaras cardíacas. 

AVC agudo (AVCi e AVCh) 

Elevação enzimática e alteração eletrocardiográfica são eventos associados ao AVC agudo, seja a forma isquêmica ou a hemorrágica. A gravidade da lesão neurológica está associada ao aumento dos níveis de troponina. 

Sabe-se que eventos neurovasculares podem produzir disautonomia importante, principalmente quando as estruturas nobres, como tronco encefálico e tálamo, são afetadas. 

O principal mecanismo associado é o desbalanço do Sistema Nervoso Autônomo (SNA), com excesso de atividade simpática e catecolaminérgica sobre os cardiomiócitos. 

Além disso, a depender da gravidade do comprometimento hemodinâmico estabelecido, pode haver maior demanda miocárdica que, associada ao desbalanço autonômico, resulta em aumento de troponina. 

Doença Pulmonar 

Doenças pulmonares que cursam, principalmente, com disfunção de VD, estão relacionadas com o aumento de troponina. Uma doença bastante conhecida e associada com esse aumento enzimático é o Tromboembolismo Pulmonar (TEP), sobretudo no que diz respeito às formas agudas e severas, que cursam com sobrecarga do ventrículo direito. 

A elevação de troponina no contexto de TEP é um marcador de pior prognóstico e de maior gravidade da doença. Outra doença que cursa com níveis anormalmente elevados de troponina é a Hipertensão Pulmonar, pelos mesmos mecanismos supracitados. 

Causas de Injúria Miocárdica Direta (Trauma ou Inflamação) 

  • Trauma Torácico; 
  • Desfibrilação;
  • Amiloidose;
  • Quimioterapia;
  • Miocardite;
  • Pericardite; 
  • Reação imune após transplante cardíaco.

A elevação de troponina na prática

Ok, agora que você já sabe algumas causas de elevação de troponina, como proceder na investigação e na formulação de hipóteses diagnósticas? 

Sempre leve em conta a idade e as comorbidades de seu paciente. Isso pode revelar importantes dicas e, principalmente, excluir causas menos prováveis de elevação de troponina. 

Exemplo 1: Paciente de 18 anos previamente hígida com antecedente pessoal de ITU de repetição vem ao PS com quadro de febre, dor lombar, sonolência e disúria há 07 dias. Sinais vitais de admissão demonstram FC 128, PA 74×48, FR 22, TEC = 5 segundos. 

Após estabilização inicial, abertura de protocolo sepse, hidratação, antibioticoterapia e suporte necessário, o laboratório liga, dizendo que a paciente apresenta troponina elevada.

A principal explicação para a elevação de troponina nesse Exemplo 1 é um quadro de sepse, gerando desbalanço entre oferta e demanda de O2. A probabilidade pré-teste desse paciente apresentar doença arterial coronariana e estar infartando na nossa frente é baixíssima, levando em conta sua idade e comorbidades prévias. 

Exemplo 2: Paciente de 68 anos, obeso, tabagista, HAS, DM2, DLP, IAM prévio há 04 anos com colocação de 02 stents em DA, ICFER após IAM, vem ao PS com quadro de epigastralgia e náuseas. Refere sensação de mal-estar intenso semelhante ao de último IAM. 

Sinais vitais estáveis, exame físico inalterado, eletrocardiograma com onda Q patológica na parede anterior. Laboratório liga referindo troponina elevada! 

Nesse segundo exemplo, podemos concluir que esse paciente apresenta risco cardiovascular elevadíssimo, nos levando para hipóteses de elevação de troponina como IAM no contexto de SCA ou de elevação de troponina crônica em paciente com Insuficiência Cardíaca. 

Sem dúvida alguma, esse paciente se beneficiará de novas coletas de enzimas cardíacas e também de uma nova estratificação cardiovascular. Novamente, a idade e as comorbidades do paciente nos levaram a essas hipóteses diagnósticas, afastando uma possível sepse. 

Exemplo 3: Paciente feminina obesa de 34 anos em uso de ACO, antecedente pessoal de Lúpus, vem ao PS com queixa de desconforto torácico importante súbito iniciado há 01 dia com piora importante nas últimas 02 horas. Sinais vitais de entrada demonstram FC 130, SO2 88%, PA 82×44, TEC = 3 segundos. Novamente, troponina veio elevada.

Neste último exemplo, as comorbidades da paciente nos fazem pensar um estado pró-trombótico que, associado a clínica apresentada pela paciente, nos sugere a presença de um TEP maciço gerando repercussão hemodinâmica e comprometimento de câmaras cardíacas direitas. 

Essa paciente até possui risco cardiovascular aumentado pela doença autoimune, porém, não é igual ao paciente do Exemplo 2, concorda? 

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HenriqueNakano

Henrique Nakano

Médico pela FMUSP. Residência em Anestesiologia pela mesma instituição.