Tricomoníase: a infecção sexualmente transmissível não-viral mais comum

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Fala, galera! Hoje vamos abordar uma das mais prevalentes infecções sexualmente transmissíveis, a tricomoníase. As infecções sexualmente transmissíveis estão cada vez mais prevalentes e impactam negativamente na vida das pacientes, portanto temos que conhecê-las e diagnosticá-las para evitar a transmissão. 

Estima-se que a tricomoníase possa acometer até 5% da população brasileira e que sua incidência pode chegar a 50% em populações vulneráveis. Lembrando que as infecções genitais são condições clínicas importantes, pois representam uma queixa muito frequente nos consultórios de ginecologia e obstetrícia, os sintomas são desagradáveis, podem causar impacto psicológico e podem interferir na vida social e sexual da paciente.

Além disso, as infecções do trato reprodutivo feminino podem propiciar a aquisição de agentes sexualmente transmissíveis, como vírus da imunodeficiência humana (HIV), clamídia e gonococo, podendo ocorrer doença inflamatória pélvica, que pode evoluir para um quadro de abdome agudo inflamatório e causar infertilidade futura. 

Etiologia da tricomoníase

Pessoal, a tricomoníase é causada por um protozoário flagelado, o Trichomonas vaginalis. Ela é uma infecção sexualmente transmissível (IST), portanto sempre que o diagnóstico for feito devemos convocar o parceiro para consulta médica e, se necessário, tratamento. Devemos também solicitar rastreio para outras ISTs, como HIV, hepatites, sífilis, infecção por clamídia e gonococo. 

Imagem 1. Representação 3D do Trichomonas vaginalis, o protozoário flagelado causador da tricomoníase, que pode ser facilmente identificado ao exame à fresco.
Imagem 1. Representação 3D do Trichomonas vaginalis, o protozoário flagelado causador da tricomoníase, que pode ser facilmente identificado ao exame à fresco.

O T. vaginalis é transmitido na relação sexual e o protozoário pode ficar vivo até mais de uma semana na uretra e no prepúcio do homem que teve relação sexual com uma paciente com a infecção. O vetor da doença é o homem, que na ejaculação leva os protozoários da uretra masculina para a vagina feminina. O Trichomonas vaginalis se estabelece na vagina tornando o meio mais alcalino, ou seja, aumentando o pH, e reduzindo a proporção de lactobacilos que existia na microbiota fisiológica.

O Trichomonas vaginalis é um protozoário que consegue fagocitar outros microorganismos, como bactérias, fungos e vírus, e pode transportá-los para o trato reprodutivo superior, propiciando a ocorrência de outras infecções e doença inflamatória pélvica. Portanto, assim que o diagnóstico for feito, a paciente deve ser orientada e tratada a fim de evitar complicações, como infecções do trato reprodutivo superior, outras ISTs, aderências pélvicas, infertilidade e parto prematuro, no caso de gestantes.

Fatores de Risco

Os principais fatores de risco para ocorrência de tricomoníase são múltiplas parcerias sexuais, início precoce de atividade sexual, relações sexuais sem uso correto de preservativos, histórico de ISTs prévias e tricomoníase anterior. 

Quadro clínico da tricomoníase

Gente, a tricomoníase costuma ser bastante sintomática nas mulheres e possui um quadro clínico florido na maioria das vezes, no entanto, existem algumas pacientes que podem ser oligo ou assintomáticas. As principais queixas das pacientes são corrimento vaginal em grande quantidade amarelo ou esverdeado, com odor desagradável, ardência vulvar, disúria, dor em baixo ventre e dispareunia.

No exame físico ginecológico observamos nos órgãos genitais externos eritema e, às vezes, podemos observar conteúdo vaginal amarelo-esverdeado saindo pelo intróito vaginal. No exame especular identificamos o corrimento vaginal amarelado ou esverdeado, mal cheiroso, que pode formar bolhas em alguns casos. As paredes da vagina e o colo do útero encontram-se hiperemiados, edemaciados e, por vezes, podemos observar o famoso “colo em aspecto de morango”, pois pode ter lesões puntiformes que ocorrem devido às sufusões hemorrágicas. 

Imagem 2. A) “Colo em aspecto de morango”, característico das vulvovaginites causadas por Trichomonas; B) corrimento bolhoso, característico.
Imagem 2. A) “Colo em aspecto de morango”, característico das vulvovaginites causadas por Trichomonas; B) corrimento bolhoso, característico.

O corrimento vaginal é a principal queixa das pacientes sintomáticas e ele ocorre em decorrência da infecção do epitélio escamoso vaginal e infiltração leucocitária. Cerca de 20% das pacientes podem apresentar corrimento amarelo-esverdeado, volumoso, bolhoso e espesso e com odor forte.

Os homens na maioria das vezes não apresentam sintomas, no entanto, por vezes eles podem apresentar um quadro de uretrite com secreção uretral purulenta, polaciúria e disúria. Normalmente a uretrite é branda e promove descarga uretral mínima com sintomas leves. Raramente pode ocorrer prostatite e epididimite como complicações. 

Diagnóstico da tricomoníase

Pessoal, o diagnóstico é clínico, baseado no quadro clínico e nas características do corrimento e do exame físico da paciente. Ao avaliarmos o conteúdo vaginal encontramos pH vaginal maior que 4,5 e o teste das aminas voláteis é positivo. Para confirmar a tricomoníase o exame mais utilizado é a bacterioscopia a fresco, onde é possível visualizar o protozoário flagelados se movimentando (sensibilidade em torno de 60%).  Também podemos utilizar a bacterioscopia com coloração de Gram para identificar o Trichomonas vaginalis. Se as bacterioscopias vierem negativas e a paciente for sintomática, devemos realizar a cultura em meio específico para identificar se há crescimento do T.  vaginalis.

Existem situações especiais, pois algumas vezes a tricomoníase é diagnosticada no exame de colpocitologia oncótica em pacientes assintomáticas. Em homens, para confirmarmos o diagnóstico de tricomoníase, podemos realizar urocultura ou utilizar swabs uretrais. 

Como a tricomoníase é uma infecção sexualmente transmissível, quando o diagnóstico é confirmado devemos orientar a paciente a rastrear outras infecções transmitidas pela via sexual, como HIV, hepatites, infecção pelo gonococo e por clamídia. Além disso, a parceria sexual da paciente deve ser convocada para avaliação médica e deve ser tratada. 

Diagnósticos diferenciais

Existem algumas condições que também podem causar sintomas parecidos com os sintomas da tricomoníase e que devem ser excluídas. São diagnósticos diferenciais da tricomoníase: vaginose bacteriana, candidíase vaginal, infecção por clamídia, infecção por gonococo e vaginose citolítica.

Tratamento da tricomoníase

Gente, a tricomoníase é uma IST curável, portanto todos os casos devem ser tratados, principalmente em pacientes gestantes, pelo risco de parto prematuro decorrente da infecção vaginal. Até pacientes assintomáticas devem ser tratadas se encontrarmos o Trichomonas vaginalis na amostra de citologia oncótica, por exemplo.

Existem alguns esquemas que podem ser feitos para o tratamento da tricomoníase. O mais utilizado é o Metronidazol 2 gramas, via oral, em dose única, porém, também podemos prescrever o Tinidazol 2 gramas, via oral, em dose única. Estudos comparativos revelam que o Tinidazol é semelhante ou até superior ao Metronidazol no tratamento da infecção e melhora dos sintomas. Esse tratamento em dose única resolve a infecção na maioria das pacientes se as parcerias sexuais forem tratadas simultaneamente e adequadamente. O tratamento com dose única não possui efetividade confirmada em homens, portanto, como alternativa, entretanto, com menor aderência ao tratamento devido à posologia, podemos prescrever Metronidazol 500 miligramas, via oral, de 12 em 12 horas por 7 dias. 

É fundamental orientar que a paciente não tenha sexual durante o tratamento para evitar reinfecção. Também temos que lembrar que sempre que utilizamos Metronidazol e Tinidazol devemos orientar a abstinência alcoólica, pois pode ocorrer o efeito antabuse, que corresponde à uma hipersensibilidade ao álcool que cursa com sintomas como cefaleia, hipotensão, vômitos e taquicardia. 

Se as pacientes continuarem sintomáticas após o tratamento correto e tivermos excluído reinfecção em relações sexuais, devemos tratar novamente com o esquema inicial: Metronidazol ou Tinidazol 2 gramas, via oral, em dose única; ou Metronidazol 500 mg, de 12 em 12 horas, por 7 dias. Se esse esquema não for suficiente para resolver a infecção, podemos prescrever Metronidazol ou Tinidazol 2 gramas, uma vez por dia, por 5 dias.

O tratamento da tricomoníase é especialmente importante nas gestantes, pois a infecção vaginal por Trichomonas vaginalis pode predispor um trabalho de parto prematuro. Portanto, todo caso suspeito deve ser tratado. Podemos prescrever tratamento via oral com 2 gramas  de Metronidazol em dose única, pois essa medicação é classificada como categoria “B” na gestação. O Tinidazol é classificado como categoria “C” e deve ser evitado.

É muito importante orientar a paciente que a tricomoníase é uma infecção sexualmente transmissível e que existem maneiras de prevenir a reinfecção. É interessante sempre orientar o uso de preservativo para relações sexuais seguras e para reduzir a transmissão de infecções sexualmente transmissíveis. 

Resumindo…

A tricomoníase é uma infecção sexualmente transmissível que pode cursar com quadro de infecção genitourinária na mulher e uretrite no homem. Ela é a IST não-viral mais prevalente na população e no Brasil pode acometer até cerca de 5% da população. 

A tricomoníase pode ser uma infecção assintomática; no entanto, as pacientes podem se queixar de ardência vulvar, dor nas relações sexuais, disúria e corrimento vaginal mal-cheiroso. Lembrando que uma das principais queixas que motivam as pacientes a procurarem ginecologistas é o corrimento vaginal, portanto temos que conhecer suas causas e seus diagnósticos diferenciais, como tricomoníase, candidíase vulvovaginal, vaginose bacteriana e vaginose citolítica. 

A tricomoníase corresponde à infecção pelo protozoário flagelado Trichomonas vaginalis. A maioria dos homens não possui sintomas, portanto a transmissão é facilitada. O diagnóstico é feito a partir dos sintomas da paciente e do exame físico, onde podemos identificar conteúdo vaginal aumentado, esverdeado, bolhoso, mal cheiroso e presença de colpite ou colo em morango. Confirmamos que se trata da tricomoníase a partir da bacterioscopia a fresco, ou na coloração de gram ou na cultura da secreção vaginal, se a bacterioscopia não revelar o protozoário flagelado.

Uma vez confirmado o diagnóstico devemos orientar a paciente a rastrear outras ISTs, convocar o parceiro para avaliação e tratamento, se necessário. As pacientes devem ser tratadas inicialmente com Metronidazol ou Tinidazol 2 gramas, via oral, em dose única. É interessante acompanhar essas pacientes para evitar que reinfecções ocorram. 

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MarinaNobrega Augusto

Marina Nobrega Augusto

Paulista, nascida em Ribeirão Preto em 1994. Formada pela Pontifícia Universidade Católica de Campinas (PUC-Campinas) em 2019. Residência em Ginecologia e Obstetrícia na EPM-UNIFESP. "Educação não transforma o mundo. Educação muda as pessoas. Pessoas transformam o mundo." - Paulo Freire.