Tratamento da esquizofrenia: como lidar com esse transtorno

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Como prometido, cá estamos em nosso último texto sobre esse transtorno! Até agora falamos sobre o que ela é, quais seus sinais e sintomas, suas etiologias, sua avaliação e diagnóstico. Para finalizar, vamos falar do tratamento da esquizofrenia, fechado?

Tudo isso? Sim, tudo isso! Em nossos primeiro e segundo textos! Agora, falaremos sobre o tratamento dessa condição! Mas, antes, vamos relembrar alguns aspectos.

A esquizofrenia é um transtorno mental grave em que há distorções no pensamento, percepção, emoções, linguagem, consciência do “eu” e comportamento. Seus principais sinais e sintomas incluem alucinações (ouvir, ver ou sentir coisas que não existem) e delírios (falsas crenças firmemente mantidas mesmo quando há provas que mostram o oposto). 

E qual a importância de estudarmos esse assunto?

Além da parte médica, “o estigma e a discriminação podem diminuir o acesso à saúde e aos serviços sociais”. Mais que isso, as pessoas com psicose, no geral, são mais expostas à violação de direitos humanos e isso a torna um foco de suma importância, não é mesmo?

A esquizofrenia geralmente tem início ao fim da adolescência ou no começo da vida adulta e o tratamento com medicamentos e apoio psicossocial é eficiente: com ele os pacientes voltam a ter vidas produtivas, a trabalhar e a estudar, possibilitando a inserção no meio social! 

Nosso objetivo é ampliar as medidas que possibilitem a assistência cotidiana e a atenção integral à vida daquele indivíduo com transtorno mental grave. Normalmente, esses pacientes enfrentam maiores dificuldades para acesso a empregos e residência.

Os sistemas de saúde ainda não conseguem abarcar todos os transtornos mentais. Há um abismo entre a oferta e demanda de tratamento em todo o mundo, mas, especialmente no Brasil. 

Segundo a Organização Pan-Americana de Saúde — OPAS —  em países de baixa e média renda, entre 76% e 85% das pessoas com transtornos mentais não recebem tratamento. Em países de alta renda, entre 35% e 50% das pessoas com transtornos mentais estão na mesma situação. E, mesmo quando o tratamento é possível, sua qualidade nem sempre é a melhor possível.

De olho em tudo: o tratamento da esquizofrenia

Como vimos, o tratamento de transtornos mentais não se basta com medicamentos e fármacos… É preciso apoio psicossocial e cuidados que vão além do orgânico, que abrangem todas as esferas da vida daquele paciente, inclusive com ajuda para encontrar emprego e moradia.

Após o início dos sintomas e o estabelecimento do diagnóstico, o foco do tratamento da esquizofrenia deve ser a remissão dos sintomas e a reabilitação ativa do paciente. 

Embora não curativos, os antipsicóticos se estabeleceram como o tratamento primário para todos os estágios da doença. 

Devemos motivar sempre nosso paciente, visando à adesão ao tratamento, pois o uso continuado auxilia na diminuição da frequência e da intensidade dos sintomas, além de minimização das internações. 

É nossa responsabilidade sempre rever a adesão em caso de ausência de resposta inicial ao tratamento ou piora do quadro após um período de estabilidade. O uso de medicamentos injetáveis de longa ação (de depósito) deve ser tentado em casos de dificuldade de adesão.

Os antipsicóticos são divididos, essencialmente, em duas classes: típicos, como o haloperidol, e atípicos, como a risperidona. 

Os antipsicóticos típicos, também chamados de convencionais, de primeira geração ou neurolépticos, são caracterizados por terem maior risco de desenvolver sintomas extrapiramidais e discinesia tardia. 

Eles podem ser divididos quanto à sua potência: alta, média e baixa, identificando os mecanismos de ação e efeitos colaterais. O mecanismo de ação dos antipsicóticos típicos se dá, principalmente, por bloqueio pós-sináptico dos receptores D2 (dopaminérgicos), com efeito antagonista.

Principais antipsicóticos típicos, com as vias de administração e efeitos colaterais mais comuns. Fonte: Neto, Alfredo Cataldo (Org.). Psiquiatria para estudantes de medicina. EDIPUCRS. Kindle Edition. 

Já os antipsicóticos atípicos, também conhecidos como antipsicóticos de segunda geração, causam muito menos sintomas extrapiramidais e discinesia do que os antipsicóticos típicos e são mais eficazes sobre os sintomas negativos e de humor. O mecanismo de ação da maioria desses fármacos também é no receptor D2. 

Geralmente, são os fármacos de primeira linha para iniciar e manter o tratamento da esquizofrenia. 

Antipsicóticos atípicos comercializados no Brasil. Fonte: Neto, Alfredo Cataldo (Org.). Psiquiatria para estudantes de medicina. EDIPUCRS. Kindle Edition. 

Existem inúmeras evidências da superioridade da clozapina em relação a outros antipsicóticos. No entanto, seu uso é limitado pelo risco de agranulocitose, um efeito colateral raro, porém grave que demanda a realização de exames de rotina. 

Assim, a clozapina na maioria dos guidelines, acaba ficando reservada para casos de esquizofrenia refratária.

Na escolha da medicação antipsicótica, devemos considerar vários fatores: a resposta terapêutica do paciente no passado, história familiar, sua experiência no manejo da droga escolhida, o perfil biológico do paciente e a sua tolerância aos efeitos indesejados. 

No primeiro episódio psicótico, a tendência é uma maior ocorrência de efeitos colaterais esperados. Por esse motivo, devemos iniciar com uma dose menor comparada às doses de manutenção de pacientes em fases mais crônicas.

Em relação a via de administração, os antipsicóticos são geralmente administrados por via oral. No entanto, em pacientes muito agitados ou agressivos, inicialmente se faz necessário o uso por via intramuscular.

Efeitos adversos do tratamento da esquizofrenia

É importante e fundamental sabermos alguns detalhes sobre os efeitos colaterais mais comuns dos antipsicóticos e como manejá-los. O principal é a Síndrome Extrapiramidal e os sintomas que a caracterizam. 

Ela ocorre em 50% a 75% dos pacientes que utilizam neurolépticos típicos, podendo manifestar-se de forma aguda ou tardia. Suas manifestações mais comuns na forma aguda são: acatisia, distonia e parkinsonismo, e na forma tardia: acatisia, distonia e discinesia. 

Distonias e discinesias agudas

São contraturas musculares ou movimentos estereotipados que surgem minutos ou horas depois do início do uso de neurolépticos. Muito frequentes durante o uso de neurolépticos típicos potentes, como o haloperidol. 

Para o tratamento da esquizofrenia, além da redução da dose ou suspensão temporária do antipsicótico, podemos também usar fármacos antiparkinsonianos, como o biperideno.

Parkinsonismo

Conjunto de manifestações que se caracterizam por diminuição dos movimentos dos braços, da expressão e da mímica facial, marcha em bloco, rigidez, tremor de extremidades, hipersalivação, bradicinesia e sinal da “roda denteada”. 

A tríade clássica sindrômica é formada por bradicinesia, tremores e rigidez muscular — com apresentação comumente bilateral,  ajudando a diferenciá-lo do parkinsonismo primário, que geralmente é assimétrico. 

Os sintomas em geral são acompanhados de “parkinsonismo mental” — indiferença emocional, afeto embotado, anedonia, diminuição da interação social, pensamento lento e dificuldade de concentração.  

O aparecimento dos sintomas de parkinsonismo medicamentoso costuma ser insidioso, entre os primeiros dias ou semanas do início do tratamento com antipsicóticos típicos, ou atípicos. Os antipsicóticos atípicos têm risco reduzido de causar parkinsonismo em relação aos típicos (já que eles têm menor antagonismo dopaminérgico D2). 

No entanto, risco reduzido não significa ausência — há relatos de casos de parkinsonismo induzido por praticamente todos os antipsicóticos disponíveis hoje. 

Acatisia

Sensação subjetiva intensa e desagradável de inquietação, associada à impossibilidade de permanecer sem se movimentar. É acompanhada de desassossego ou pernas inquietas, necessidade de se movimentar para aliviar a inquietação e incapacidade de sentar ou ficar parado por alguns minutos. 

É comum com o uso de antipsicóticos de alta potência ou mesmo atípicos. 

A acatisia pode aparecer desde o primeiro ou segundo dia, ou até várias semanas após o início do uso do medicamento. Também pode surgir tardiamente, mesmo sem alteração da dose da medicação, ou, ainda, logo após a redução da dose ou a retirada do fármaco. É importante distinguir do sintoma ansiedade. 

Indicação de hospitalização

Como vimos, são muitos os antipsicóticos disponíveis, com diferentes perfis de efeitos colaterais, porém com eficácia semelhante quando usados em doses equivalentes. 

E quando indicar a hospitalização de um paciente com esquizofrenia? As indicações mais comuns são: agitação psicomotora, risco de auto e heteroagressão, exaustão familiar, risco de suicídio, sintomas psicóticos moderados a graves, exposição moral, efeitos adversos moderados a graves, e manejo medicamentoso ao paciente refratário ou com pouca adesão.

E finalizamos por aqui!

Terminamos aqui nossa série de textos sobre esquizofrenia. Espero muito que tenhamos conseguido elencar os principais pontos de atenção e destaque da patologia para que vocês utilizem esse material para aprendizado e consultas futuras.

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LarissaMenezes

Larissa Menezes

Nascida em Franca/SP, em 92, formou-se em medicina pela PUC-Campinas, em 2018. Especialista em Clínica Médica pela UNICAMP e completamente apaixonada por essa área cheia de detalhes e interpretações. Filha de professora e de um ávido leitor, cresceu com muito amor pelo ensino também, unindo essa paixão à medicina.